23 de dez. de 2008

Natal e Ano Novo

O olho a boca o ouvido

O
olho
a
boca
o
ouvido

os olhos que buscam e entregam o que deveria ser retido
os lábios que travam a palavra ansiada
os ouvidos que passivamente se deixam inundar de sons

um carrosel
um amargor
tudo difuso.

(a.l.k.)

Espelhos, cristais, vidros

Espelhos
Cristais
Vidros cortantes me cercam
Vidros tenazes e blindados também
E eu me desfacelo contra eles
Escorro por sobre eles
como densa chuva vermelha.
Cravejados na pele os cristais
que brilham preciosos
Nos espelhos estilhaçados
Sou muitos e todos e vários
Diferentes e infinitos.

(a.l.k.)

23 de nov. de 2008

Say It Isn't So

Say it isn't so,

Say it isn't so,
Everyone is saying
you don't love me,
Say it isn't so.

Everywhere I go,
Everyone I know,

Whispers that you're growing tired of me,
Say it isn't so.
People say that you,

Found somebody new,
And it won't be long
before you leave me,
Say it isn't true,

Say that everything is still okay,
That's all I want to know,

and what they're saying,
SAY IT ISN'T SO.

(Irving Berlin)

21 de nov. de 2008

Estrada branca

Estrada branca
Lua branca
Noite alta
Tua falta caminhando
Caminhando, caminhando
Ao lado meu
Uma saudade
Uma vontade
Tão doída
De uma vida
Vida que morreu

Estrada, passarada
Noite clara
Meu caminho é tão sozinho
Tão sozinho
A percorrer
Que mesmo andando
Para a frente
Olhando a lua tristemente
Quanto mais ando
Mais estou perto
De você

Se em vez de noite
Fosse dia
O sol brilhasse
E a poesia
Em vez de triste
Fosse alegre
De partir
Se em vez de eu ver
Só minha sombra
Nessa estrada
Eu visse ao longo
Dessa estrada
Uma outra sombra
A me seguir

Mas a verdade
É que a cidade
Ficou longe, ficou longe
Na cidade
Se deixou meu bem-querer
Eu vou sozinho sem carinho
Vou caminhando meu caminho
Vou caminhando com vontade de morrer

(Tom Jobim e Vinícius de Moraes)

19 de nov. de 2008

Impossibilidade sobre mim

Mais do mesmo. Nem é criativo. Nem quero sê-lo. Quero me expressar. Mas penso. E busco. E quero atrelada a cada palavra uma iluminação. No túnel escuro por onde passa aquilo que chamo vida se espremem andam sensações e desejos e nuncas. Há sempre uma impossibilidade sobre mim. Uma rarefeita névoa sobre os meus desejos e sobre os meus movimentos uma densa e glacial neblina. Eu me perco. Labirinto. Eu me perco. Labirito. Eu vou não. Eu despiso. Desando. Desfaleço estátua. Inerte. Mas com coração. E assim a bruma depositada sobre a pele fria se confunde com as àguas quentes tristes do de dentro.

(a.l.k.)

5 de nov. de 2008

Ralador

Pra dor de amor, eu não faço sala
Amor me deixa, outro amor me embala
Eu sou um coco que seu ralador não rala
A tristeza quando chega
Se deixar, ela se instala
Se ela vê peito vazio
Quer fazer festa de gala, ê
Mas comigo não tem jeito
Ela nem desfaz a mala
Que um amor quando me deixa, sinhô
Tem outro em ponto de bala
A tristeza a gente sente
Quando o seu chicote estala
Se ela vê sinal de pranto
Lambe o beiço e se regala
Mas meu peito não se curva
À bota, tacão, bengala
Meu amor que é de quilombo (iáiá, kekerê, iê, iê)
Não se prende em dor de senzala

(Roque Ferreira e Paulo César Pinheiro)

Milágrimas

Em caso de dor ponha gelo
Mude o corte de cabelo
Mude como modelo
Vá ao cinema dê um sorriso
Ainda que amarelo, esqueça seu cotovelo
Se amargo foi já ter sido
Troque já esse vestido
Troque o padrão do tecido
Saia do sério deixe os critérios
Siga todos os sentidos
Faça fazer sentido
A cada mil lágrimas sai um milagre

Em caso de tristeza vire a mesa
Coma só a sobremesa coma somente a cereja
Jogue para cima faça cena
Cante as rimas de um poema
Sofra penas viva apenas
Sendo só fissura ou loucura
Quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena reze um terço
Caia fora do contexto invente seu endereço
A cada mil lágrimas sai um milagre

Mas se apesar de banal
Chorar for inevitável
Sinta o gosto do sal do sal do sal
Sinta o gosto do sal
Gota a gota, uma a uma
Duas três dez cem mil lágrimas sinta o milagre
A cada mil lágrimas sai um milagre

(Itamar Asumpção e Alice Ruiz)

Pela janela e o vento

É noite agora.
Noite de verdade.
O céu é opaco e profundamente azul, escuro, quase negro.
Cintilam poucas luzes de dentro dele.
Há bem mais luz ao redor. Mas não em mim.
Há o vento.
Se só ele existisse e mais nada eu seria também feliz.
Quem sabe.
Se ele soprasse em círculos, com rajadas alternadas
de frescor e de escaldante torpor.
De qualquer forma que ele me atingisse, eu iria.
Eu voava.
Voaria com ele para além.
Se eu pulasse ele me ergueria?
Se me jogasse todo em seus braços, o vento seria reconfortante berço?

(a.l.k.)

4 de nov. de 2008

Bosque

No topo da árvore
Na copa mais densa
Na folhagem mais verde
Há o repouso mais calmo
Perfumado pelos ventos.
Ora silente,
Ora inundado de delicados sons.
Assustadores sons:
O vento forte.
A ramagem,
Os rugidos.
Os pios estertorosos.
O orvalho por sobre as folhas
É o suor que brota da fronte angustiada.
Do temor da escuridão gotejam
Suores e lágrimas.
E de cima da árvore tudo é abismo.

(a.l.k.)

31 de out. de 2008

Gal e Tom




Em 1984, foi ao ar pela TV Manchete uma série de programas musicais chamada "A Música Segundo Tom Jobim". Com direção de Nelson Pereira dos Santos, o programa era gravado na casa do maestro, no Jardim Botânico, no Rio, com a participação de convidados recebidos muito à vontade por ele e seu piano.

No primeiro programa da série, Tom e Gal Costa, em companhia de Dori e Danilo Caymmi, fizeram uma homenagem a Ary Barroso, contando histórias e lembrando de algumas canções do grande compositor brasileiro.

Aparecem no vídeo: "Pra Machucar Meu Coração", "Faceira", "Canta Brasil" (Alcir Pires Vermelho), "Tema de Amor Por Gabriela" (Tom Jobim) e "Aquarela do Brasil".

Heróis da Liberdade

Samba, ó samba
Tem a sua primazia
Em gozar de felicidade
Samba, meu samba
Presta esta homenagem
Aos heróis da liberdade

Passava noite, vinha dia
O sangue do negro corria
Dia a dia
De lamento em lamento
De agonia em agonia
Ele pedia o fim da tirania
Lá em Vila Rica
Junto ao largo da Bica
Local da opressão
A fiel maçonaria, com sabedoria
Deu sua decisão
Com flores e alegria
Veio a abolição
A independência Laureando
O seu brasão
Ao longe soldados e tambores
Alunos e professores
Acompanhados de clarim
Cantavam assim
Já raiou a liberdade
A liberdade já raiou
Essa brisa que a juventude afaga
Essa chama
Que o ódio não apaga pelo universo
É a evolução em sua legítima razão

Samba, ó samba
Tem a sua primazia
Em gozar de felicidade
Samba, meu samba
Presta esta homenagem
Aos heróis da liberdade

Ô, ô, ô, ô
Liberdade senhor!

(Silas de Oliveira, Mano Décio e Manoel Ferreira)

29 de out. de 2008

O circo místico

Não
Não sei se é um truque banal
Se um invisível cordão
Sustenta a vida real

Cordas de uma orquestra
Sombras de um artista
Palcos de um planeta
E as dançarinas no grande final

Chove tanta flor
Que, sem refletir
Um ardoroso espectador
Vira colibri

Qual
Não sei se é nova ilusão
Se após o salto mortal
Existe outra encarnação

Membros de um elenco
Malas de um destino
Partes de uma orquestra
Duas meninas no imenso vagão

Negro refletor
Flores de organdi
E o grito do homem voador
Ao cair em si

Não sei se é vida real
Um invisível cordão
Após o salto mortal

(Edu Lobo - Chico Buarque/1982)

Para o balé O grande circo místico
Ilustração de Naum Alves de Souza

Hilda Hilst

"Quem és? Perguntei ao desejo.
Respondeu: lava. Depois pó. Depois nada."

"Para onde vão os trens, meu pai? Para Mahal, Tami, para Camiri, espaços no mapa, e depois o pai ria: também para lugar nenhum, meu filho, tu podes ir e ainda que se mova o trem tu não te moves de ti"

Gato gaiato (não minto pra mim)

Pelo o que me diz respeito
Eu sou feito de dúvidas
O que é torto, o que é direito diante da vida?
O que é tido como certo, duvido
Sou fraco, safado, sofrido
E não minto pra mim

Vou montado no meu medo
E mesmo que eu caia
Sou cobaia de mim mesmo
No amor e na raiva

Vira e mexe me complico
Reciclo, tô farto, tô forte, tô vivo
E só morro no fim

Lá do alto do telhado pula quem quiser
Só o gato que é gaiato cai de pé

E pra quem anda nos trilhos: cuidado com o trem
Eu por mim já descarrilho
E não atendo a ninguém
Só me rendo pelo brilho de quem vai fundo
E mergulha com tudo pra dentro de si

E se a gente coincidisse
Num sonho qualquer
Eu contigo, tu comigo
Os dois, homem e mulher
Sendo a soma e tendo a chance de ser
Um par de pessoas na boa
Vivendo felizes.

(Jean Garfunkel – Paulo Garfunkel – Prata)

19 de out. de 2008

I Need Some Fine Wine and You, You Need to Be Nicer

Sit, good dog, stay, bad dog, down, roll over
Well here's a good man and a pretty young girl
Trying to play together somehow,
I'm wasting my life, you're changing the world,
I get drunk and watch your head grow

It's the good times that we share
and the bad times that we'll have
It's the good times
and the bad times that we had

Well it's been a long slow collision,
I'm a pitbull, you're a dog,
Baby you're foul in clear conditions
But you're handsome in the fog

So I need some fine wine, and you, you need to be nicer
For the good times and the bad times
That we'll have

Sometimes we talk over dinner like old friends
Till I go and kill the bottle,
I go off over any old thing,
Break your heart
and raise a glass or ten

To the good times that we shared and the bad times that we'll have
To the good times
and the bad time that we've had

Well it's been a long slow collision,
I'm a pitbull, you're a dog,
Baby you're foul in clear conditions
But you're handsome in the fog

So I need some fine wine and you, you need to be nicer
For the good times
and the bad times we know will come
Yeah
I need some fine wine
and you, you need to be nicer
you need to be nicer
you need

For the good times
and the bad time that we had
Sit

Good times, bad times
Sweet wine, bad wine
Good cop, bad cop,
Lapdog, bad dog
Sit.

(THE CARDIGANS)


5 de out. de 2008

Paul Thomas Anderson's 'MAGNOLIA'

"...tenho amor para dar, só não sei onde colocá-lo..."




Aimee Mann's 'Wise Up'

It's not
What you thought
When you first began it
You got
What you want
Now you can hardly stand it though,
By now you know
It's not going to stop
It's not going to stop
It's not going to stop
'Til you wise up

You're sure
There's a cure
And you have finally found it
You think
One drink
Will shrink you 'til you're underground
And living down
But it's not going to stop
It's not going to stop
It's not going to stop
'Til you wise up

Prepare a list of what you need
Before you sign away the deed
'Cause it's not going to stop
It's not going to stop
It's not going to stop
'Til you wise up
No, it's not going to stop
'Til you wise up
No, it's not going to stop
So just...give up

-----------------

Não é o que você pensou
Quando você começou isso
Você conseguiu o que queria
Agora você mal consegue suportar, embora
Agora você saiba, isso não vai parar
Isso não vai parar
Isso não vai parar
Até você se tocar

Você está certo de que existe uma cura
E que você finalmente encontrou ela.
Você pensa que um drinque
Vai encolher você, até você quase desaparecer
E estar no chão, mas isso não vai parar
Isso não vai parar
Isso não vai parar
Até você se tocar

Prepare uma lista do que você precisa
Antes que a morte venha te buscar
Porque isso não vai parar
Isso não vai parar
Isso não vai parar
Até você se tocar

Não, isso não vai parar
Até você se tocar
Não, isso não vai parar
Então simplesmente desista

30 de set. de 2008

Tremmmmmmmmmmmmmmmmmm

Um trem que passa pela multidão. Um trem bala por entre os escombros. Rápido luzidio branco incólume limpo livre de toda sujeira ao redor. A sujeira das ruínas e dos corpos desmantelados, putrefatos, torpes, agonizantes, sangrentos. Um trem que ondula por entre a mágoa e a escuridão e segue brilhando, insensível. A coisa não sente. E eu também. A coisa é tão rápida que nem é nem está e é tudo e já não é. E eu sou nada silenciosamente e estertorosamente um tudo: milissegundo, e de novo: perplexo e inerte. O trem é mais coração que eu. Eu só tenho a máquina que faz jorrar o ferro líquido, o qual a coisa tão sólida faz disso a sua altivez: a dureza firme de seguir brilhante sobre o dilacerado.

(a.l.k.)

20 de set. de 2008

Comes love

Comes a rainstorm, put your rubbers on your feet
Comes a snowstorm, you can get a little heat
Comes love, nothing can be done
Comes a fire, then you know just what to do
Blow a tire, you can buy another shoe
Comes love, nothing can be done

Don't try hiding, 'cause there isn't any use
You will start sliding, when your heart turns on the juice
Comes a headache, you can lose it in a day
Comes a toothache, see your dentist right away
Comes love, nothing can be done


Comes a heat wave, you can hurry to the shore
Comes a summons, you can hide behind the door
Comes love, nothing can be done
Comes the measles, you can quarantine the room,
Comes a mousie, you can chase it with a broom
Comes love, nothing can be done.

That's all brother, if you ever been in love
That's all brother, you know just what I'm speaking of
Comes a nightmare, you can always stay awake
Comes depression, you may get another break
Comes love, nothing can be done

(Lew Brown / Sammy Stept / Charles Tobias)

always with BILLIE HOLIDAY, forever and ever

2 de set. de 2008

Negro Amor

Vá, se mande, junte tudo que você puder levar
Ande, tudo que parece seu é bom que agarre já
Seu filho feio e louco ficou só
Chorando feito fogo à luz do sol
Os alquimistas já estão no corredor
E não tem mais nada, negro amor
A estrada pra você e o jogo e a indecência
Junte tudo que você conseguiu por coincidência
E o pintor de rua que anda só
Desenha a maluquice em seu lençol
Sob seus pés o céu também rachou
E não tem mais nada, negro amor
Seus marinheiros mareados abandonam o mar
Seus guerreiros desarmados não vão mais lutar
Seu namorado já vai dando o fora
Levando os cobertores, e agora?
Até o tapete sem você voou
E não tem mais nada, negro amor
As pedras do caminho, deixe para trás
Esqueça os mortos que eles não levantam mais
O vagabundo esmola pela rua
Vestindo a mesma roupa que foi sua
Risque outro fósforo, outra vida, outra luz, outra cor
E não tem mais nada, negro amor

(Caetano Veloso - Pericles R. Cavalvanti - Bob Dylan)

30 de ago. de 2008

I carry your heart with me

E. E. Cummings

I carry your heart with me
(I carry it in my heart)
I am never without it
(anywhere I go you go, my dear;
and whatever is done
by only me is your doing, my darling)

I fear no fate
(for you are my fate, my sweet)
I want no world
(for beautiful you are my world, my true)
and it’s you are whatever a moon has always meant
and whatever a sun will always sing is you

here is the deepest secret nobody knows
(here is the root of the root and the bud of the bud
and the sky of the sky of a tree called life; which grows
higher than the soul can hope or mind can hide)
and this is the wonder that’s keeping the stars apart

I carry your heart
(I carry it in my heart)


---------------------------

Carrego seu coração comigo
(eu o carrego no meu coração)
nunca estou sem ele
(onde quer que eu vá, você vai, minha querida;
e o que quer que seja feito por mim
é feito por você, minha querida)

não temo o destino
(pois você é o meu destino, minha vida)
não quero o mundo
(pois você é o meu mundo, minha adorada)
e você é o que a lua sempre significou,
o que o sol sempre cantou

aqui está o segredo mais profundo que ninguém sabe
(aqui está a raiz da raiz, o broto do broto
e o céu do céu de uma árvore chamada vida;
que cresce mais alta do que a alma pode ansiar
ou a mente pode esconder)
e aqui está o fênomeno que mantém as estrelas separadas.

Carrego seu coração
(eu carrego no meu coração)

A arte de perder

One Art
Elizabeth Bishop


The art of losing isn't hard to master;
so many things seem filled with the intent
to be lost that their loss is no disaster.

Lose something every day. Accept the fluster
of lost door keys, the hour badly spent.
The art of losing isn't hard to master.

Then practice losing farther, losing faster:
places, and names, and where it was you meant
to travel. None of these will bring disaster.

I lost my mother's watch. And look! my last, or
next-to-last, of three loved houses went.
The art of losing isn't hard to master.

I lost two cities, lovely ones. And, vaster,
some realms I owned, two rivers, a continent.
I miss them, but it wasn't a disaster.

-Even losing you (the joking voice, a gesture
I love) I shan't have lied. It's evident
the art of losing's not too hard to master
though it may look like (Write it!) like disaster.



Tradução de Paulo Henriques Britto

“A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
De perdê-las, que perder não é nada sério.
Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
A chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Depois perca mais rápido, com mais critério:
Lugares, nomes, a escala subseqüente
Da viagem não feita. Nada disso é sério.
Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
Lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Perdi duas cidades lindas. E um império
Que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.
– Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo que eu amo)
não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério. “

That Lucky Old Sun (Just Rolls Around Heaven All Day)

Up in the morning, out on the job
Work like the devil for my pay
But the lucky old sun has nothing to do
But roll around heaven all day

Fuss with my lover, toil for my kids
Sweat til I'm wrinkled and grey
While the lucky old sun has nothing to do
But roll around heaven all day

Good Lord above can't you know I'm pining
Tears all in my eyes
Send down that cloud with a silver lining
Lift me to paradise

Show me the river, take me across
Wash all my troubles away
Like the lucky old sun give me nothing to do
But roll around heaven all day

Good Lord above can't you know I'm pining
Tears all in my eyes
Send down that cloud with a silver lining
Lift me to paradise

Show me the river, take me across
Wash all my troubles away
Like the lucky old sun give me nothing to do
But roll around heaven all day

Roll around, roll around heaven all day
Roll around, roll around heaven all day

(Gillespie-Smith)

You Can't Lose A Broken Heart

Don't lose your head
Then lose your love
You can't lose a broken heart
If you ever break up
Then try to make up
It's tough to make a brand new start

Take a walk
Think it over
While strolling neath the moon
Don't say things in December
You'll regret in June

Ware your remark
Before you speak
Or you may be sorry soon,
Don't be erratic
Be diplomatic
To keep your heart's in tune

Cruel harsh words
Often spoken
Will upset your applecart
So don't lose your head
Then lose your love
Cos, you can't lose a broken heart
No, you can't lose a broken heart!

((James P. Johnson / Flournoy E. Miller)

Walk On By

If you see me walking down the street
And i start to cry each time we meet
Walk on by, walk on by

Make believe
That you don't see the tears
Just let me grieve
In private 'cause each time i see you
I break down and cry
And walk on by (don't stop)
And walk on by (don't stop)
And walk on by

I just can't get over losing you
And so if i seem broken and blue
Walk on by, walk on by

Foolish pride
Is all that i have left
So let me hide
The tears and the sadness you gave me
When you said goodbye
Walk on by
And walk on by
And walk by (don't stop)

Walk on by, walk on by
Foolish pride
Is all that i have left
So let me hide
The tears and the sadness you gave me
When you said goodbye
Walk on by (don't stop)
And walk on by (don't stop)
And walk by (don't stop)

(Burt Bacharach / Hal David)

A Kiss To Build a Dream On

Gimme a kiss to build a dream on
And my imagination
Will thrive upon that kiss
Sweetheart, i ask no more than this
A kiss to build a dream on

Give me a kiss before you leave me
And my imagination
Will feed my hungry heart
Leave me one thing before we part
A kiss to build a dream on

When i'm alone with my fancies
I'll be with you
Weaving romances
Making believe they're true

Oh, gimme your lips for just a moment
And my imagination
Will make that moment live
Give me what you alone can give
A kiss to build a dream on

Gimme a kiss to build a dream on
And my imagination
Will thrive upon that kiss
Sweetheart, i ask no more than this
A kiss to build a dream on


When i'm alone with my fancies
I'll be with you
Weaving romances
Making believe they're true

Oh, gimme your lips for just a moment
And my imagination
Will make that moment live
Give me what you alone can give
A kiss to build a dream on

(Bert Kalmar, Harry Ruby and Oscar Hammerstein II)

Dream A Little Dream Of Me

Stars shining bright above you
Night breezes seem to whisper "I love you"
Birds singing in the sycamore tree
Dream a little dream of me

Say "Night-ie night" and kiss me
Just hold me tight and tell me you'll miss me
While I'm alone and blue as can be
Dream a little dream of me

Stars fading but I linger on, dear
Still craving your kiss
I'm longing to linger till dawn, dear
Just saying this

Sweet dreams till sunbeams find you
Sweet dreams that leave all worries behind you
But in your dreams whatever they be
Dream a little dream of me

(Wilbur Schwandt and Fabian Andree / Gus Kahn)

28 de ago. de 2008

De manhã

É de manhã
É de madrugada
É de manhã
Não sei mais de nada
É de manhã
Vou ver meu amor
É de manhã
Vou ver minha amada
É de manhã
Flor da madrugada
É de manhã
Vou ver minha flor

Vou pela estrada
E cada estrela é uma flor
Mas a flor amada
É mais que a madrugada
E foi por ela
Que o galo cocorocô

(Caetano Veloso)

Pessoas invisíveis

Ouvi há algum tempo, nem lembro de quem nem onde, a expressão “pessoas invisíveis” aplicada àquelas pessoas que tão comumente vemos pedindo e vendendo coisas pelas ruas. Sim, “invisíveis”. Desvia-se delas como se ali não estivessem, como um mero obstáculo, um objeto, uma coisa. É certo que se formos parar e dar atenção ou dinheiro para todas que encontramos no caminho a coisa fica inviável. No entanto, além do dinheiro, pra fins diversos, seja realmente para comer, para comprar remédio, ou para um fim menos nobre, talvez essas pessoas queiram simplesmente atenção. Alguém que as veja e ouça, que as conforte.

Hoje, um guri no ponto de ônibus, com vinte anos ou menos, pediu moedas, segundo ele para comer. Creio que realmente fosse. Ele era bonito, loiro, dentes perfeitos, mal vestido, meio sujo, com roupas que certamente já tinham sido de outra pessoa. Como não é incomum notar nas pessoas que pedem, ele tinha um olhar triste e subserviente, o que muitas vezes não passa de mera encenação; entretanto, senti que não era e dei a moeda. Ele começou a falar algo, meio a chorar, eu continuei no meu mundo, na música que eu ouvia, mal lhe prestei atenção. Ele agradeceu e se foi. Talvez ele quisesse ser ouvido, visto. Talvez não ser invisível fosse mais importante do que receber um real. Enfim, pensei que poderia ter prestado atenção no que ele queria dizer, coisa que ninguém no ponto de ônibus fez, tampouco deu dinheiro, e nisso penso também que melhor do ter dado dinheiro seria ter comprado um lanche pra ele.

Mas novamente isso se tornaria inviável, haja vista o imenso número de pessoas na mesma situação. Às vezes em certos lugares é impossível andar cem metros sem ser abordado. Essas situações, sempre constrangedoras, detonam uma carga reflexiva imensa: esmola não resolve, quem pede pode estar agindo de má fé. Esmola não resolve a situação da pessoa, mas é um paliativo importante para quem tem fome... Qual a solução? Uma delas seria tornar essas pessoas visíveis. Visíveis cada uma e todas. Contudo, como fazer isso com tranqüilidade quando se teme ser assaltado ou enganado? Intuição não basta. E instituição?

(a.l.k.)

20 de ago. de 2008

Mortes múltiplas

Tantas idéias: Mortes múltiplas. Sentimentos do avesso e tortos num terremoto devastador. Mil e uma vezes o gosto do sangue na boca e o desejo de que ele se esvaísse até a derradeira gota, inconsciente e adormecida, finda e calma.. Sem precisão. E precisamente alguma coisa. Algo que nunca forafui e agora é desvivendo. Só assim é. Assim é só. Só é assim. Só. Sempre. Só. Inconsciente, adormecido, calmo, findo. Vidas múltiplas na morte sem fim.

(a.l.k.)

Seu espião

Ver você dormir
Me corta o coração
Se o seu sorriso
É sonho ou traição
O que você sonhou
Eu nunca vou saber
Me dá uma pista
Que eu possa percorrer
Não que eu seja ciumento
É apenas precaução
Quando você acordar
E não puder lembrar
O que sentiu
Será que não mentiu pra mim
Quantos beijos de amor
Você pode sonhar
Em mil histórias
Onde eu não posso entrar
Deixa eu ler seu pensamento
Deixa eu ser seu espião
Deixa eu ser seu espião
Alguém tem que controlar o seu coração
Deixa eu ser seu espião
Alguém tem que controlar o seu coração
Deixa eu ser seu espião
Alguém tem que controlar o seu coração
Deixa eu ser seu espião
Alguém tem que controlar o seu coração

(Leoni, Paula Toller e Herbert Vianna)

Por que não eu?

Quando ela cai no sofá
So far away
Vinho à beça na cabeça
Eu que sei

Quando ela insiste em beijar seu travesseiro
Eu me viro do avesso
Eu vou dizer aquelas coisas
Mas na hora esqueço

Por que não eu?
Por que não eu?
Por que não eu?
Por que não eu?

Eu encomendo um jantar
Só pra nós dois
Se não tem nada depois
Então por que não eu?

Você tá nessa rejeitada
Caçando paixão
Eu com a cara mais lavada
Digo: por que não?

Por que não eu?
Por que não eu?
Por que não eu?
Por que não eu?

(Leoni, Paula Toller e Herbert Vianna)

19 de ago. de 2008

Pressentimento

Ai! Ardido peito
Quem irá entender o teu segredo?
Quem irá pousar em teu destino
E depois morrer do teu amor?

Ai! Mas quem virá?
Me pergunto a toda hora
E a resposta é o silêncio
Que atravessa a madrugada

Vem, meu novo amor
Vou deixar a casa aberta
Já escuto os teus passos
Procurando o meu abrigo

Vem, que o sol raiou
Os jardins estão florindo
Tudo faz pressentimento
Que este é o tempo ansiado
De ser ter felicidade

(Elton Medeiros / Hermínio Bello de Carvalho)




Alcione e Elton Medeiros




Marília Medalha

18 de ago. de 2008

Um Ser de Luz

Um dia
Um ser de luz nasceu
Numa cidade do interior
E o menino Deus lhe abençoou
De manto branco ao se batizar
Se transformou num sabiá
Dona dos versos de um trovador
E a rainha do seu lugar
Sua voz então
Ao se espalhar
Corria chão
Cruzava o mar
Levada pelo ar
Onde chegava
Espantava a dor
Com a força do seu cantar

Mas aconteceu um dia
Foi que o menino Deus chamou
E ela se foi pra cantar
Para além do luar
Onde moram as estrelas
E a gente fica a lembrar
Vendo o céu clarear
Na esperança de vê-la, sabiá

Sabiá
Que falta faz tua alegria
Sem você, meu canto agora é só
Melancolia
Canta, meu sabiá, voa, meu sabiá
Adeus, meu sabiá, até um dia

(João Nogueira, Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro)

16 de ago. de 2008

É doce morrer no mar

É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
A noite que ele não veio foi
Foi de tristeza prá mim
Saveiro voltou sozinho
Triste noite foi prá mim

É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
Saveiro partiu de noite foi
Madrugada não voltou
O marinheiro bonito
Sereia do mar levou

É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
Nas ondas verdes do mar meu bem
Ele se foi afogar
Fez sua cama de noivo
No colo de Iemanjá

É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar

(Dorival Caymmi)

Chão de giz

Eu desço dessa solidão
Espalho coisas sobre
Um Chão de Giz
Há meros devaneios tolos
A me torturar
Fotografias recortadas
Em jornais de folhas
Amiúde!
Eu vou te jogar
Num pano de guardar confetes
Eu vou te jogar
Num pano de guardar confetes...

Disparo balas de canhão
É inútil, pois existe
Um grão-vizir
Há tantas violetas velhas
Sem um colibri
Queria usar quem sabe
Uma camisa de força
Ou de vênus
Mas não vou gozar de nós
Apenas um cigarro
Nem vou lhe beijar
Gastando assim o meu batom...

Agora pego
Um caminhão na lona
Vou a nocaute outra vez
Prá sempre fui acorrentado
No seu calcanhar
Meus vinte anos de "boy"
That's over, baby!
Freud explica...

Não vou me sujar
Fumando apenas um cigarro
Nem vou lhe beijar
Gastando assim o meu batom
Quanto ao pano dos confetes
Já passou meu carnaval
E isso explica porque o sexo
É assunto popular...

No mais estou indo embora!
No mais estou indo embora!
No mais estou indo embora!
No mais!...

(Zé Ramalho)

Outras Palavras

Nada dessa cica de palavra triste em mim na boca
Travo, trava mãe e papai, alma buena, dicha louca
Neca desse sono de nunca jamais nem never more
Sim, dizer que sim pra Cilu, pra Dedé, pra Dadi e Dó
Crista do desejo o destino deslinda-se em beleza:
Outras palavras

Tudo seu azul, tudo céu, tudo azul e furta-cor
Tudo meu amor, tudo mel, tudo amor e ouro e sol
Na televisão, na palavra, no átimo, no chão
Quero essa mulher solamente pra mim, mais, muito mais
Rima, pra que faz tanto, mas tudo dor, amor e gozo:
Outras palavras

Nem vem que não tem, vem que tem coração, tamanho trem
Como na palavra, palavra, a palavra estou em mim
E fora de mim
quando você parece que não dá
Você diz que diz em silêncio o que eu não desejo ouvir
Tem me feito muito infeliz mas agora minha filha:
Outras palavras

Quase João, Gil, Ben, muito bem mas barroco como eu
Cérebro, máquina, palavras, sentidos, corações
Hiperestesia, Buarque, voilá, tu sais de cor
Tinjo-me romântico mas sou vadio computador
Só que sofri tanto que grita porém daqui pra a frente:
Outras palavras

Parafins, gatins, alphaluz, sexonhei da guerrapaz
Ouraxé, palávoras, driz, okê, cris, espacial
Projeitinho, imanso, ciumortevida, vivavid
Lambetelho, frúturo, orgasmaravalha-me Logun
Homenina nel paraís de felicidadania:
Outras palavras

(Caetano Veloso)

14 de ago. de 2008

Medalha de São Jorge

Fica ao meu lado, São Jorge Guerreiro
Com tuas armas, teu perfil obstinado
Me guarda em ti, meu Santo Padroeiro
Me leva ao céu em tua montaria
Numa visita a lua cheia
Que é a medalha da Virgem Maria
Do outro lado, São Jorge Guerreiro
Põe tuas armas na medalha enluarada
Te guardo em mim, meu Santo Padroeiro
A quem recorro em horas de agonia
Tenho a medalha da lua cheia
Você casado com a Virgem Maria
O mar e a noite lembram a Bahia
Orgulho e força, marcas do meu guia
Conto contigo contra os perigos
Contra o quebranto de uma paixão
Deus me perdoe essa intimidade:
Jorge me guarde no coração
Que a malvadeza desse mundo é grande em extensão
E muita vez tem ar de anjo
E garras de dragão

(Moacyr Luz e Aldir Blanc)

Can't Take My Eyes Off Of You

You're just too good to be true
can't take my eyes off of you
You'd be like heaven to touch
I wanna hold you so much
At long last love has arrived
and I thank God I'm alive
You're just too good to be true
can't take my eyes off of you

Pardon the way that I stare,
there's nothing else to compare
The sight of you leaves me weak
there are no words left to speak
But if you feel like I feel,
please let me know that it's real
You're just too good to be true,
can't take my eyes off of you

I love you baby and if it's quite all right,
I need you baby to warm the lonely nights
I love you baby trust in me when I say
Oh pretty baby don't bring me down I pray
Oh pretty baby now that I found you, stay
And let me love you baby, let me love you

You're just too good to be true
can't take my eyes off of you
You'd be like heaven to touch
I wanna hold you so much
At long last love has arrived
and I thank God I'm alive
You're just too good to be true
can't take my eyes off of you

I love you baby and if it's quite all right,
I need you baby to warm the lonely night
I love you baby trust in me when I say
Oh pretty baby don't bring me down I pray
Oh pretty baby now that I found you, stay
And let me love you baby, let me love you

(Frankie Valli And The Four Seasons)

8 de ago. de 2008

Todas as Cartas de Amor são Ridículas

Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)

Álvaro de Campos

30 de jul. de 2008

A mais bonita

Não, solidão, hoje não quero me retocar
Nesse salão de tristeza onde as outras penteiam mágoas
Deixo que as águas invadam meu rosto
Gosto de me ver chorar
Finjo que estão me vendo
Eu preciso me mostrar

Bonita
Pra que os olhos do meu bem
Não olhem mais ninguém
Quando eu me revelar
Da forma mais bonita
Pra saber como levar todos
Os desejos que ele tem
Ao me ver passar
Bonita
Hoje eu arrasei
Na casa de espelhos
Espalho os meus rostos
E finjo que finjo que finjo
Que não sei

(Chico Buarque)

Todo o sentimento

Preciso não dormir
Até se consumar
O tempo
Da gente
Preciso conduzir
Um tempo de te amar
Te amando devagar
E urgentemente
Pretendo descobrir
No último momento
Um tempo que refaz o que desfez
Que recolhe todo o sentimento
E bota no corpo uma outra vez

Prometo te querer
Até o amor cair
Doente
Doente
Prefiro então partir
A tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente
Depois de te perder
Te encontro, com certeza
Talvez num tempo da delicadeza
Onde não diremos nada
Nada aconteceu
Apenas seguirei, como encantado
Ao lado teu

(Cristóvão Bastos - Chico Buarque)

29 de jul. de 2008

Tira as mãos de mim

Ele era mil
Tu és nenhum
Na guerra és vil
Na cama és mocho
Tira as mãos de mim
Põe as mãos em mim
E vê se o fogo dele
Guardado em mim
Te incendeia um pouco

Éramos nós
Estreitos nós
Enquanto tu
És laço frouxo
Tira as mãos de mim
Põe as mãos em mim
E vê se a febre dele
Guardada em mim
Te contagia um pouco

(Chico Buarque - Ruy Guerra)

Coração ateu

O meu coração ateu quase acreditou
Na sua mão que não passou de um leve adeus

Breve pássaro pousado em minha mão
Bateu asas e voou
Meu coração por certo tempo passeou
Na madrugada procurando um jardim
Flor amarela, flor de uma longa espera
Logo meu coração ateu

Se falo em mim e não em ti
É que nesse momento
Já me despedi
Meu coração ateu
Não chora e não lembra
Parte e vai-se embora

(Sueli Costa)

Monólogo de Orfeu

Este é um dos trechos mais bonitos do primeiro ato da peça, em que Orfeu sobressalta-se quando Eurídice lhe diz "Até, neguinho. Volto num instante".
Orfeu tem um mau presságio, e pede à amada que não o deixe. Eurídice responde: "Meu neguinho, que bobagem! E' um instantinho só. Volto com a aragem..."


Orfeu:

Ai, que agonia que você me deu
Meu amor! que impressão, que pesadelo!
Como se eu te estivesse vendo morta
Longe como uma morta...

Eurídice:

Morta eu estou.
Morta de amor, eu estou; morta e enterrada
Com cruz por cima e tudo!

Orfeu (sorrindo):

Namorada!
Vai bem depressa. Deus te leve. Aqui
Ficam os meus restos a esperar por ti
Que dás vida!

(Eurídice atira-lhe um beijo e sai).

Mulher mais adorada!
Agora que não estás, deixa que rompa
O meu peito em soluços! Te enrustiste
Em minha vida; e cada hora que passa
E' mais porque te amar, a hora derrama
O seu óleo de amor, em mim, amada...
E sabes de uma coisa? cada vez
Que o sofrimento vem, essa saudade
De estar perto, se longe, ou estar mais perto
Se perto, - que é que eu sei! essa agonia
De viver fraco, o peito extravasado
O mel correndo; essa incapacidade
De me sentir mais eu, Orfeu; tudo isso
Que é bem capaz de confundir o espírito
De um homem - nada disso tem importância
Quando tu chegas com essa charla antiga
Esse contentamento, essa harmonia
Esse corpo! e me dizes essas coisas
Que me dão essa fôrça, essa coragem
Esse orgulho de rei. Ah, minha Eurídice
Meu verso, meu silêncio, minha música!
Nunca fujas de mim! sem ti sou nada
Sou coisa sem razão, jogada, sou
Pedra rolada. Orfeu menos Eurídice...
Coisa incompreensível! A existência
Sem ti é como olhar para um relógio
Só com o ponteiro dos minutos. Tu
És a hora, és o que dá sentido
E direção ao tempo, minha amiga
Mais querida! Qual mãe, qual pai, qual nada!
A beleza da vida és tu, amada
Milhões amada! Ah! criatura! quem
Poderia pensar que Orfeu: Orfeu
Cujo violão é a vida da cidade
E cuja fala, como o vento à flor
Despetala as mulheres - que êle, Orfeu
Ficasse assim rendido aos teus encantos!
Mulata, pele escura, dente branco
Vai teu caminho que eu vou te seguindo
No pensamento e aqui me deixo rente
Quando voltares, pela lua cheia
Para os braços sem fim do teu amigo!
Vai tua vida, pássaro contente
Vai tua vida que eu estarei contigo!


Orfeu da Conceição', Vinicius de Moraes, Livraria S. José, Rio, 1960.

28 de jul. de 2008

Cicatrizes

Amor
Amor que nunca cicatriza
Ao menos ameniza a dor
Que a vida não amenizou.

Que a vida a dor domina
Arrasa e arruína
Depois passa por cima a dor
Em busca de outro amor.

Acho que estou pedindo uma coisa normal
Felicidade é um bem natural.

Uma
Qualquer uma
Que pelo menos dure enquanto é carnaval
Apenas uma
Qualquer uma
Não faça bem mais que também não faça mal.

Meu coração precisa...

(Miltinho - Paulo Cesar Pinheiro)


atualização do post de 28/07/08


Preciso me encontar

Deixe-me ir, preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir pra não chorar
Quero assistir ao sol nascer
Ver as águas dos rios correr
Ouvir os pássaros cantar
Eu quero nascer, quero viver
Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir pra não chorar
Se alguém por mim perguntar
Diga que eu só vou voltar
Quando eu me encontrar
Quero assistir ao sol nascer
Ver as águas do rio correr
Ouvir os pássaros cantar
Eu quero nascer, quero viver
Deixe-me ir, preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir pra não chorar

(Candeia)

27 de jul. de 2008

O Samba é Meu Dom

O Samba é meu dom
Aprendi bater samba, ao compasso do meu coração
De quadra, de enredo, de roda, na palma da mão
De breque, de partido alto e o samba canção.
O samba é meu dom
Aprendi dançar samba, vendo samba de pé no chão
No Império Serrano a escola da minha paixão
No terreiro, na rua, no bar, gafieira e salão.
O samba é meu dom
Aprendi cantar samba com quem dele fez profissão
Mário Reis, Vassourinha, Ataulfo, Ismael, Jamelão
Com Roberto Silva, Sinhô, Donga, Ciro e João.
O samba é meu dom
Aprendi muito samba com quem sempre fez
Samba bom
Silas, Zinco, Aniceto, Anescar, Cachiné, Jaguarão
Zé Com Fome, Herivelto, Marçal, Mirabô, Henricão.
O samba é meu dom
É no samba que eu vivo e do samba que eu
Ganho o meu pão
É no samba que eu quero morrer de baqueta na mão
Pois quem é de samba o meu nome
Não esquece mais não

(Wilson das Neves - Paulo César Pinheiro)



Wilson das Neves




Fabiana Cozza e Zimbo Trio

Trajetória

Não perca tempo assim contando história
Pra que forçar tanto a memória
Pra dizer
Que a triste hora do fim se faz notória
E continuar a trajetória
É retroceder
Não há no mundo lei que possa condenar
Alguém que a um outro alguém deixou de amar
Eu já me preparei, parei para pensar
E vi que é bem melhor não perguntar
Porque é que tem que ser assim
Ninguém jamais pode mudar
Recebe menos quem mais tem pra dar
E agora queira dar licença, que eu já vou
Deixa assim, por favor
Não ligue se acaso o meu pranto rolar, tudo bem
Me deseje só felicidade, vamos manter a amizade
Mas não me queira só por pena
Nem me crie mais problemas
Nem perca tempo assim contando história...

(Arlindo Cruz - Serginho Meriti - Franco)







Fabiana Cozza e Maria Rita

Tendência

Você entrou na minha vida
Usou e abusou, fez o que quis
E agora se desespera, dizendo que é infeliz
Não foi surpresa pra mim, você começou pelo fim
Não me comove o pranto de quem é ruim, e assim
Quem sabe essa mágoa passando
Você venha se redimir
Dos erros que tanto insistiu por prazer
Pra vingar-se de mim
Diz que é carente de amor
Então você tem que mudar
Se precisar, pode me procurar

Não... pra que lamentar
O que aconteceu... era de esperar
Se eu lhe dei a mão... foi por me enganar
Foi sem entender, que amor não pode haver
Sem compreensão, a desunião... tende aparecer
E aí está... o que aconteceu
Você destruiu, o que era seu !

Você entrou na minha vida
Usou e abusou, fez o que quis
E agora se desespera, dizendo que é infeliz
Não foi surpresa pra mim, você começou pelo fim
Não me comove o pranto de quem é ruim, e assim
Quem sabe essa mágoa passando
Você venha se redimir
Dos erros que tanto insistiu por prazer
Pra vingar-se de mim
Diz que é carente de amor
Então você tem que mudar
Se precisar, pode me procurar!

(Dona Ivone Lara)

Eclipse oculto

Nosso amor não deu certo, gargalhadas e lágrimas
De perto fomos quase nada
Tipo de amor que não pode dar certo na luz da manhã
E desperdiçamos os blues do Djavan

Demasiadas palavras, fraco impulso de vida
Travada a mente na ideologia
E o corpo não agia como se o coração tivesse antes que optar
Entre o inseto e o inseticida

Não me queixo, eu não soube te amar
Mas não deixo de querer conquistar
Uma coisa qualquer em você, o que será?

Como nunca se mostra o outro lado da lua
Eu desejo viajar do outro lado da sua
Meu coração galinha de leão não quer mais
amarrar frustração
Ó eclipse oculto na luz do verão

Mas bem que nós fomos muito felizes só durante o
prelúdio
Gargalhadas e lágrimas até irmos pro estúdio
Mas na hora da cama nada pintou direito
É, minha cara, falar, não sou proveito sou pura
fama

Não me queixo, eu não soube te amar
Mas não deixo de querer conquistar
Uma coisa qualquer em você, o que será?

Nada tem que dar certo, nosso amor é bonito
Só não disse ao que veio, atrasado e aflito
E paramos no meio sem saber os desejos aonde
é que iam dar
E aquele projeto ainda estará no ar?

Não quero que você fique fera comigo
Quero ser seu amor, quero ser seu amigo
Quero que tudo saia como som de Tim Maia, sem
grilos de mim
Sem desespero, sem tédio, sem fim

(Caetano Veloso)

Pra rua me levar

Não vou viver, como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho aonde eu vou
As vezes ando só, trocando passos com a solidão
Momentos que são meus e que não abro mão

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você


É... mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas, talvez você nem queira ouvir

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você...

(Ana Carolina - Totonho Villeroy)

Cantada (Depois de ter você)

Depois de ter você,
pra quê querer saber que horas são?
Se é noite ou faz calor,
se estamos no verão,
se o sol virá ou não,
ou pra quê é que serve uma canção como essa?

Depois de ter você, poetas para quê?
Os deuses, as dúvidas,
pra quê amendoeiras pelas ruas?
Para quê servem as ruas?
Depois de ter você...

(Adriana Calcanhotto)

Sou Eu

Sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo,
Espécie de acessório ou sobressalente próprio,
Arredores irregulares da minha emoção sincera,
Sou eu aqui em mim, sou eu.

Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou.
Quanto quis, quanto não quis, tudo isso me forma.
Quanto amei ou deixei de amar é a mesma saudade em mim.

E, ao mesmo tempo, a impressão, um pouco inconseqüente,
Como de um sonho formado sobre realidades mistas,
De me ter deixado, a mim, num banco de carro elétrico,
Para ser encontrado pelo acaso de quem se lhe ir sentar em cima.

E, ao mesmo tempo, a impressão, um pouco longínqua,
Como de um sonho que se quer lembrar na penumbra a que se acorda,
De haver melhor em mim do que eu.

Sim, ao mesmo tempo, a impressão, um pouco dolorosa,
Como de um acordar sem sonhos para um dia de muitos credores,
De haver falhado tudo como tropeçar no capacho,
De haver embrulhado tudo como a mala sem as escovas,
De haver substituído qualquer coisa a mim algures na vida.

Baste! É a impressão um tanto ou quanto metafísica,
Como o sol pela última vez sobre a janela da casa a abandonar,
De que mais vale ser criança que querer compreender o mundo —
A impressão de pão com manteiga e brinquedos
De um grande sossego sem Jardins de Prosérpina,
De uma boa-vontade para com a vida encostada de testa à janela,
Num ver chover com som lá fora
E não as lágrimas mortas de custar a engolir.

Baste, sim baste! Sou eu mesmo, o trocado,
O emissário sem carta nem credenciais,
O palhaço sem riso, o bobo com o grande fato de outro,
A quem tinem as campainhas da cabeça
Como chocalhos pequenos de uma servidão em cima.

Sou eu mesmo, a charada sincopada
Que ninguém da roda decifra nos serões de província.

Sou eu mesmo, que remédio! …


Álvaro de Campos

25 de jul. de 2008

Eu preciso aprender a só ser

Sabe, gente.
É tanta coisa pra gente saber.
O que cantar, como andar, onde ir.
O que dizer, o que calar, a quem querer.

Sabe, gente.
É tanta coisa que eu fico sem jeito.
Sou eu sozinho e esse nó no peito.
Já desfeito em lágrimas que eu luto pra esconder.

Sabe, gente.
Eu sei que no fundo o problema é só da gente.
E só do coração dizer não, quando a mente.
Tenta nos levar pra casa do sofrer.

E quando escutar um samba-canção.
Assim como: "Eu preciso aprender a ser só".
Reagir e ouvir o coração responder:
"Eu preciso aprender a só ser."

(Gilberto Gil)




Renato Braz

Lamento Sertanejo

Por ser de lá
Do sertão, lá do cerrado
Lá do interior do mato
Da caatinga e do roçado
Eu quase não saio
Eu quase não tenho amigo
Eu quase que não consigo
Ficar na cidade sem viver contrariado

Por ser de lá
Na certa, por isso mesmo
Não gosto de cama mole
Não sei comer sem torresmo
Eu quase não falo
Eu quase não sei de nada
Sou como rês desgarrada
Nessa multidão, boiada caminhando a esmo

(Dominguinhos - Gilberto Gil)

Dinorah, Dinorah

Quando a turma reunia alguém sempre pedia
Ah, Dinorah, Dinorah
E o malandro descrevia e logo já se via
É, Dinorah, Dinorah
E até que ela chegasse a um motel de classe
Vi, Dinorah, Dinorah
Dava um frio na barriga e pé pra muita briga
Vi, Dinorah, Dinorah
E nos espelhos ela se despe, dança nos olhos uma chacrete
E o pessoal na pior: repete!
Mas o verdadeiro fato está dentro do quarto
Vi, Dinorah, Dinorah
Ele abre o seu armário e vê no calendário
É, Dinorah, Dinorah
Desenhando na lapela a boca, o beijo dela
Ah, Dinorah, Dinorah

(Ivan Lins e Vitor Martins)



Verônica Ferriani

Ciranda da bailarina

Procurando bem
Todo mundo tem pereba
Marca de bexiga ou vacina
E tem piriri, tem lombriga, tem ameba
Só a bailarina que não tem
E não tem coceira
Berruga nem frieira
Nem falta de maneira
Ela não tem

Futucando bem
Todo mundo tem piolho
Ou tem cheiro de creolina
Todo mundo tem um irmão meio zarolho
Só a bailarina que não tem
Nem unha encardida
Nem dente com comida
Nem casca de ferida
Ela não tem

Não livra ninguém
Todo mundo tem remela
Quando acorda às seis da matina
Teve escarlatina
Ou tem febre amarela
Só a bailarina que não tem
Medo de subir, gente
Medo de cair, gente
Medo de vertigem
Quem não tem

Confessando bem
Todo mundo faz pecado
Logo assim que a missa termina
Todo mundo tem um primeiro namorado
Só a bailarina que não tem
Sujo atrás da orelha
Bigode de groselha
Calcinha um pouco velha
Ela não tem

O padre também
Pode até ficar vermelho
Se o vento levanta a batina
Reparando bem, todo mundo tem pentelho
Só a bailarina que não tem
Sala sem mobília
Goteira na vasilha
Problema na família
Quem não tem

Procurando bem
Todo mundo tem...

(Edu Lobo - Chico Buarque)




Mônica Salmaso e Grupo Pau Brasil

24 de jul. de 2008

A história de Lily Braun

Como num romance
O homem dos meus sonhos
Me apareceu no dancing
Era mais um
Só que num relance
Os seus olhos me chuparam
Feito um zoom

Ele me comia
Com aqueles olhos
De comer fotografia
Eu disse cheese
E de close em close
Fui perdendo a pose
E até sorri, feliz

E voltou
Me ofereceu um drinque
Me chamou de anjo azul
Minha visão
Foi desde então ficando flou

Como no cinema
Me mandava às vezes
Uma rosa e um poema
Foco de luz
Eu, feito uma gema
Me desmilingüindo toda
Ao som do blues

Abusou do scotch
Disse que meu corpo
Era só dele aquela noite
Eu disse please
Xale no decote
Disparei com as faces
Rubras e febris

E voltou
No derradeiro show
Com dez poemas e um buquê
Eu disse adeus
Já vou com os meus
Numa turnê

Como amar esposa
Disse ele que agora
Só me amava como esposa
Não como star
Me amassou as rosas
Me queimou as fotos
Me beijou no altar

Nunca mais romance
Nunca mais cinema
Nunca mais drinque no dancing
Nunca mais cheese
Nunca uma espelunca
Uma rosa nunca
Nunca mais feliz

(Edu Lobo e Chico Buarque)



Mônica Salmaso e Grupo Pau Brasil

Viver de Amor

Quem quis me ferir
Ficou assim
Não aprendeu perdoar
Morrer de amor até o fim
Não brinque de esconder

Não fica bem
Você mentir depois de jurar
Desperdiçar
O tempo de tentar morder
E provar de amor e não largar
Pra tentar conhecer

Quem olha pra mim
Me vê feliz
Não sabe o que é duvidar
Viver de amor até o fim
Não quero mais chorar

Sem perceber
Jogar a vida inteira no ar
Saber de cor
Viver do jeito que se quer
E morrer de amor e não ligar
Pra tentar esquecer

(Milton Nascimento)

22 de jul. de 2008

Todos dos lugares

freqüentas as minhas mais
estranhas fantasias
e todas as manhãs
és o meu pão e o leite
me salvas do jejum
nas madrugadas frias
e à noite sempre volto a te pedir:
me aceite

não venho de lugar algum
especialmente
pois já passei por todos os lugares
eu muito sinto tudo isso e sei que sentes
se acaso não concordo quando me acordares

quero-te mais do que imaginas ser possível
te trouxe um búzio mágico dessa viagem
marinha melodia ao pé do teu ouvido
já que pensas que sou um marinheiro audaz

faça de conta
que nada disso conta
que não importa exceto
estarmos outra vez aqui
abra-me novamente a sua porta
pois eu jamais parti

(Sueli Costa e Tite de Lemos)

Cartas de Amor de Fernando Pessoa ...

(...)
Quanto a mim...
(...) O amor passou. (....)Peço que não faça como a gente vulgar, que é sempre reles; que não me volte a cara quando passe por si, nem tenha de mim uma recordação em que entre o rancor. Fiquemos, um perante o outro, como dois conhecidos desde a infância, que se amaram um pouco quando meninos, e, embora na vida adulta sigam outras afeições e outros caminhos, conservam sempre, num escaninho da alma, a memória profunda do seu amor antigo e inutil.
(...)

Fernando Pessoa

IN

Ophelinha:



Agradeço a sua carta. Ella trouxe-me pena e allivio ao mesmo tempo. Pena, porque estas cousas fazem sempre pena; allivio, porque, na verdade, a unica solução é essa - o não prolongarmos mais uma situação que não tem já a justificação do amor, nem de uma parte nem de outra. Da minha, ao menos, fica uma estima profunda, uma amisade inalteravel. Não me nega a Ophelinha outro tanto, não é verdade?

Nem a Ophelinha, nem eu, temos culpa nisto. Só o Destino terá culpa, se o Destino fosse gente, a quem culpas se attribuissem.

O Tempo, que envelhece as faces e os cabellos, envelhece tambem, mas mais depressa ainda, as affeições violentas. A maioria da gente, porque é estupida, consegue não dar por isso, e julga que ainda ama porque contrahiu o habito de se sentir a amar. Se assim não fosse, naão havia gente feliz no mundo. As creaturas superiores, porém, são privadas da possibilidade d'essa illusão, porque nem podem crer que o amor dure, nem, quando o sentem acabado, se enganam tomando por elle a estima, ou a gratidão, que elle deixou.

Estas cousas fazem soffrer, mas o soffrimento passa. Se a vida, que é tudo, passa por fim, como não hão de passar o amor e a dor, e todas as mais cousas, que não são mais que partes da vida?

Na sua carta é injusta para commigo, mas comprehendo e desculpo; decerto a escreveu com irritação, talvez mesmo com magua, mas a maioria da gente - homens ou mulheres - escreveria, no seu caso, num tom ainda mais acerbo, e em termos ainda mais injustos. Mas a Ophelinha tem um feitio optimo, e mesmo a sua irritação não consegue ter maldade. Quando casar, se não tiver a felicidade que merece, por certo que não será sua a culpa.

Quanto a mim...

O amor passou. Mas conservo-lhe uma affeição inalteravel, e não esquecerei nunca - nunca, creia - nem a sua figurinha engraçada e os seus modos de pequeneina, nem a sua ternura, a sua dedicação, a sua indole amoravel. Pode ser que me engane, e que estas qualidades, que lhe attribúo, fossem uma illusão minha; mas nem creio que fossem, nem, a terem sido, seria desprimor para mim que lh'as attribuisse.

Não sei o que quer que lhe devolva - cartas ou que mais. Eu preferia não lhe devolver nada, e conservar as suas cartinhas como memoria viva de uma passado morto, como todos os passados; como alguma cousa de commovedor numa vida, como a minha, em que o progresso nos annos é par do progresso na infelicidade e na desillusão.

Peço que não faça como a gente vulgar, que é sempre reles; que não me volte a cara quando passe por si, nem tenha de mim uma recordação em que entre o rancor. Fiquemos, um perante o outro, como dois conhecidos desde a infancia, que se amaram um pouco quando meninos, e, embora na vida adulta sigam outras affeições e outros caminhos, conservam sempre, num escaninho da alma, a memoria profunda do seu amor antigo e inutil

Que isto de "outras affeições" e de "outros caminhos" é consigo, Ophelinha, e não commigo. O meu destino pertence a outra Lei, de cuja existencia a Ophelinha nem sabe, e está subordinado cada vez mais á obediência a Mestres que não permittem nem perdoam.

Não é necessario que comprehenda isto. Basta que me conserve com carinho na sua lembrança, como eu, inalteravelmente, a conservarei na minha.


Fernando

29/XI/1920



Cartas de Amor de Fernando Pessoa, Organização, posfácio e notas de David Mourão-Ferreira, Preâmbulo e estabelecimento do texto de Maria da Graça Queiroz, Edições Ática, Lisboa 1978, pp. 131-133.

17 de jul. de 2008

40 GRAUS DE FEBRE

Pura? Que vem a ser isso?
As línguas do inferno
São baças, baças como as tríplices

Línguas do apático, gordo Cérbero
Que arqueja junto à entrada. Incapaz
De lamber limpamente

O febril tendão, o pecado, o pecado.
Crepita a chama.
O indelével aroma

De espevitada vela!
Amor, amor, escassa a fumaça
Rola de mim como a echarpe de Isadora, e temo

Que uma das bandas venha a prender-se na roda.
A amarela e morosa fumaça
Faz o seu próprio elemento. Não irá alto

Mas rolará em redor do globo
A asfixiar o idoso e o humilde,
O frágil

E delicado bebê no seu berço,
A lívida orquídea
Suspensa do seu jardim suspenso no ar,

Diabólico leopardo!
A radiação faz que ela embranqueça
E a extingue em uma hora.

Engordurar os corpos dos adúlteros
Tal qual as cinzas de Hiroshima e corroê-los.
O pecado. O pecado.

Querido, a noite inteira
Eu passei oscilando, morta, viva, morta, viva.
Os lençois opressivos como beijos de um devasso.

Três dias. Três noites.
água de limão, canja
Aguada, enjoa-me.

Sou por demais pura para ti ou para alguém.
Teu corpo
Magoa-me como o mundo magoa Deus. Sou uma lanterna -

Minha cabeça uma lua
De papel japonês, minha pele de ouro laminado
Infinitamente delicada e infinitamente dispendiosa.

Não te assombra meu coração. E minha luz.
Eu sou, toda eu, uma enorme camélia
Esbraseada e a ir e vir, em rubros jorros.

Creio que vou subir,
Creio que posso ir bem alto -
As contas de metal ardente voam, e eu, amor, eu

Sou uma virgem pura
De acetileno
Acompanhada de rosas,

De beijos, de querubins,
Do que venham a ser essas coisas rosadas.
Não tu, nem ele

Não ele, nem ele
(Eu toda a dissolver-me, anágua de puta velha) -
Ao Paraíso.

Sylvia Plath

(Tradução: Afonso Félix de Souza)

15 de jul. de 2008

But not for me

Old man sunshine listen you
Never tell me dreams come true
Just try it and I'll start a riot
Beatrice Fairfax don't you dare
Ever tell me he will care
I'm certain it's the final curtain
I never want to hear from any cheerful Pollyannas
Who tell you fate supplies a mate
It's all bananas

They're writing songs of love but not for me
A lucky star's above but not for me
With love to lead the way I've found more clouds of gray
Than any Russian play could guarantee

I was a fool to fall and get that way
Hi-ho.. alas... and also lack-a-day
Although I can't dismiss the memory of his kiss
I guess he's not for me

(George and Ira Gershwin)




JUDY GARLAND ("Girl Crazy")

12 de jul. de 2008

No frio

Não foi
Nem foi
Nem quis
Esteve
Não soube
Houve
Nem como
Nem porquê
Sorriu estertoroso
Foi

(a.l.k.)

Desfolho

Depois de tudo e no entorno do pensamento mórbido resta o gosto do desprazer. O prazer desfeito, abortado, feto, seminal, inóquo, mas imensamente triste por sabê-lo que poderia ter sido o que não foi. Como aquele que não nasceu ou antes de ser mesmo desviveu. Vou desvivendo a cada dia, cronologica e naturalmente e sem somar a mim o peso das folhas. Dos livros. Das árvores. De flandres. Assim, amanhã, tão leve, o vento terá o esforço mínimo para me fazer feliz.

(a.l.k.)

Meu mundo e nada mais

Quando eu fui ferido vi tudo mudar
Das verdades que eu sabia

Só sobraram restos que eu não esqueci
Toda aquela paz que eu tinha

Eu que tinha tudo hoje estou mudo, estou mudado
À meia-noite, à meia luz, pensando
Daria tudo por um modo de esquecer

Eu queria tanto estar no escuro do meu quarto
À meia-noite, à meia luz, sonhando
Daria tudo por meu mundo e nada mais

Não estou bem certo se ainda vou sorrir
Sem um traço de amargura

Como ser mais livre, como ser capaz
de enxergar um novo dia

(Guilherme Arantes)

Tristesse

Como você pode pedir
Pra eu falar do nosso amor
Que foi tão forte e ainda é
Mas cada um se foi
Quanta saudade brilha em mim
Se cada sonho é seu
Virou história em sua vida
Mas prá mim não morreu
Lembra, lembra, lembra, cada instante que passou
De cada perigo, da audácia do temor
Que sobrevivemos que cobrimos de emoção
Volta a pensar então
Sinto, penso, espero, fico tenso toda vez
Que nos encontramos, nos olhamos sem viver
Pára de fingir que não sou parte do seu mundo
Volta a pensar então
Como você pode pedir...

(Telo Borges - Milton Nascimento)

De fora, de dentro, o inverso impossível

Eu sempre assim de um modo que eu desconheço, nem busco, atraio palavras. Elas me vêm aos montes pelos olhos, ouvidos, vêm, vêm. Eu as recebo e devolvo o possível sumo de suas essências. No entanto algo em mim dentro perdura. Uma sujeira, um risco, um travo daquelas letras todas e fonemas. Duras, cruas. Quase sempre elas são assim mesmo, assim mesmo pra mim: coisas. Mas eu sei bem que são sentimento. Eu sou. E triste louca amargamente quem ouve ou lê aquilo que há por dentro? Por dentro de mim. Quem dilui, me ajuda a diluir, quem faz? Ninguém.

(a.l.k.)

Negrinho do Pastoreio

Neguinho do pastoreio
Acha o meu amor pra mim
Ou corto seu devaneio
Com a nega do pixaim

Não adianta me olhar feio
Não posso viver assim
Minha vida está no meio
E parece que está no fim

Senão, escrevo e não leio
Te transformo em querubim
Meu nego do pastoreio
Acha o meu amor pra mim

(Joyce)

9 de jul. de 2008

Vai saber?

Não vá pensando que determinou
Sobre o que só o amor pode saber
Só porque disse que não me quer
Não quer dizer que não vá querer
Pois tudo o que se sabe do amor
É que ele gosta muito de mudar
E pode aparecer onde ninguém ousaria supor

Só porque disse que de mim não pode gostar
Não quer dizer que não tenha do que duvidar
Pensando bem, pode mesmo
Chegar a se arrepender
E pode ser então que seja tarde demais
Vai saber?

Não vá pensando que determinou
Sobre o que só o amor pode saber
Só porque disse que não me quer
Não quer dizer que não vá querer
Pois tudo o que se sabe do amor
É que ele gosta muito de se dar
E pode aparecer onde ninguém ousaria se pôr

Só porque disse que de mim não pode gostar
Não quer dizer que não tenha o que considerar
Pensando bem, pode mesmo
Chegar a se arrepender
E pode ser então que seja tarde demais
Vai saber?
Vai saber?
Vai saber?

Não vá pensando que determinou
Sobre o que só o amor pode saber
Só porque disse que não me quer
Não quer dizer que não vá querer
Pois tudo o que se sabe do amor
É que ele gosta muito de jogar
E pode aparecer onde ninguém ousaria supor

Só porque disse que de mim não pode gostar
Não quer dizer que não venha a reconsiderar
Pensando bem, pode mesmo
Chegar a se arrepender
E pode ser então que seja tarde demais...

(Adriana Calcanhotto)

6 de jul. de 2008

Por um fio

Por um fio eu me parto em dois
Aceito o que a sorte dispôs
No meu caminho
Vejo a vida, a morte e o depois
Não vou viver jamais sozinho
Porque sou dois
Sou mais que dois
Sou muitos fios
Que vão se tecendo
Com a voz do outro em mim
E quem canta não sabe o fim
Com medo e alegria
Ele anda por um fio

(José Miguel Wisnik e Paulo Neves)

2 de jul. de 2008

E O VENTO LEVOU

Você foi como veio
Um amor que sem freio
Disparou em nós essa emoção
Confiamos em nós, nos perdemos
Achando imbatível a nossa paixão.

Os momentos em que nos amamos
Vivemos, cantamos, deixamos passar
Confiamos em nós, nos perdemos
Ficando a vontade do tempo voltar.

A saudade foi o que sobrou
Deste amor que brincou
Ao julgar ser capaz
De prever, de cuidar, de zelar
De nutrir, de salvar, de guardar
Ser a nossa proteção
Deixou marcas na alma a lição
E hoje só o coração
Pra agüentar essa dor
És a folha que o vento levou
E eu atrás perseguindo
Buscando-te em vão.

(Wilson das Neves / Cláudio Jorge)

19 de jun. de 2008

Rugas

Se eu for pensar muito na vida
Eu morro cedo amor
Meu peito é forte
Nele tenho acumulado tanta dor
As rugas fizeram
Residência no meu rosto
Não choro pra ninguém
Me ver sofrer de desgosto
Eu que sempre soube
Esconder a minha mágoa
Nunca ninguém me viu
Com os olhos rasos d'água
Finjo-me alegre
Pro meu pranto ninguém ver
Feliz aquele que sabe sofrer

(Nelson Cavaquinho / Ary Monteiro/ Augusto Garcês)

I love the way you're breaking my heart

I love the way you're breaking my heart
It's terribly, terribly, terribly, terribly
Thrilling
I love the way you're breaking my heart
Although you're gonna ruin it
It's heaven while you're doin' it

I love the way I feel when we kiss
You're terribly, terribly, terribly
Irresistible
Sigh to me, and lie to me, you really know how
It's gonna hurt tomorrow, but it feels so good now
So darling, just keep playing your part
Take your time and really finish the things that you start
'Cause I love the way you're breaking my heart!

(Peggy Lee)

I fall in love too easily

I fall in love too easily
I fall in love too fast
I fall in love too terribly hard
For love to ever last
My heart should be well-schooled
'Cause I been fooled in the past
But still I fall in love too easily
I fall in love too fast

My heart should be well-schooled
'Cause I been fooled in the past
But still I fall in love too easily
I fall in love too fast

(Sammy Cahn & Jule Styne)

11 de jun. de 2008

O problema é meu

O problema é meu. Eu transponho o peso, a carga e resta a dor residual, inativa, mas presente. Assim como nos pulmões o ar que já não serve pra manter a vida. Inútil. O problema é meu. No "sim" que sai da minha boca, e dolorosamente no "não" que entra pelos meus tímpanos. Tenho eu que decidida, forte e precisamente ser livre. Livre de mim e para mim. E sobretudo firme. Firmíssimo no desejo e na palavra. Não há culpa em quem é, o problema é meu que não sou.

(a.l.k.)

10 de jun. de 2008

da morte à vida

Sentimentos controversos e sobre e neles um gosto estranho de desprazer. Uma memória de uma prazer longínquo que apodreceu, se esvaiu como a última gota de sangue de um corpo, como a derradeira gota de suor dum corpo sob sol escaldante do Saara. Entretanto, na cabeça ainda e de novo lampeja a vontade de retomar o ciclo. Desmorrer para desviver.

(a.l.k)

3 de jun. de 2008

Valha-me Deus

Não sou eu o pecador que prometeu, depois negou
E ao renegar se machucou de vez
Se apredejou com suas próprias leis
E eram leis ilegais, indecentes, venais, baseadas na insensatez
Valha-me o Deus te dar perdão!
Mas ai do meu amor, ai que desilusão
É uma questão de se aperceber
E a sentença é se saber julgar
Se eu te devo reter, se eu te devo odiar, te punir ou te expulsar
Não posso mais é me ferir de um jeito assim
Expor as chagas desse amor sei que não vou
Não sou chinelo pra você me usar
No que arrastou, dependurou
Nem sou pandeiro pra você me batucar
E desse jeito eu me esborracho, eu me enrasco
Mas assim não dá, perdão, não dô
E pode gastar seu joelho e o seu terço que eu me torço
Mas perdão não dou
Errou, levou o troco na mesma moeda com que me pagou

Não posso mais é me ferir de um jeito assim
Expor as chagas desse amor sei que não vou
Não sou chinelo pra você me usar
No que arrastou, dependurou
Nem sou pandeiro pra você me batucar
E desse jeito eu me esborracho, eu me rasgo
Mas assim não dá, perdão, não dô
E pode gastar seu joelho e o seu terço que eu me torço
Mas perdão não dou
Errou, levou o troco na mesma moeda que pagou

Vou te escorraçar
Vou até torcer pra você errar
Que é para de novo se roer
Vou te espicaçar, vou te ofender
Vou te machucar
Que é pra você nunca se esquecer
Vou te enxovalhar, vou te entristecer
Vou te afogar nas águas da chuva que escorrer
Vou te enlamear, vou te enlouquecer
Eu vou te lembrar que é pra você nunca se esquecer

(Baden Powell – Hermínio Bello de Carvalho)

1 de jun. de 2008

Cida Moreyra - Angenor


GRANDIOSO, DELICADO, SIMPLES. EXCELENTE.

Autonomia

É impossível nesta primavera, eu sei.
Impossível, pois longe estarei,
Mas pensando em nosso amor, amor sincero.
Ai! se eu tivesse autonomia
Se eu pudesse gritaria:
Não vou, não quero!
Escravizaram assim um pobre coração.
É necessária a nova abolição
Pra trazer de volta a minha liberdade.
Se eu pudesse gritaria, amor.
Se eu pudesse brigaria, amor.
Não vou, não quero!

(Cartola)

Sala de Recepção

Habitada por gente simples e tão pobre
Que só tem o sol que a todos cobre
Como podes, mangueira, cantar?

Pois então saiba que não desejamos mais nada
A noite, a lua prateada
Silenciosa, ouve as nossas canções

Tem lá no alto um cruzeiro
Onde fazemos nossas orações
E temos orgulho de ser os primeiros campeões

Eu digo e afirmo que a felicidade aqui mora
E as outras escolas até choram
Invejando a tua posição

Minha mangueira essa sala de recepção
Aqui se abraça inimigo
Como se fosse irmão

(Cartola)

Nós Dois

Está chegando o momento
De irmos pro altar
Nós dois
Mas antes da cerimônia
Devemos pensar em depois
Terminam nossas aventuras

Chega de tanta procura
Nenhum de nós deve ter
Mais alguma ilusão
Devemos trocar idéias
E mudarmos de idéias
Nós dois
E se assim procedermos
Seremos felizes depois
Nada mais nos interessa
Sejamos indiferentes
Só nós dois, apenas dois,
Eternamente

(Cartola)

Canta

Canta, meu bem, canta,
Quero ouvir teu cantar!
Chora, meu bem, chora,
Quero ver a tua lágrima derramar!
Sofre porque foste a culpada.
Apele para a justiça do meu coração,
Talvez não sejas condenada.
O teu pranto me faz confusão
E por isso eu fiz essa canção,
Depois de uma grande falsidade
Terei que dizer que sinto muita saudade.

Canta, meu bem, canta,
Quero ouvir teu cantar!
Chora, meu bem, chora,
Quero ver a tua lágrima derramar”
Sofre porque foste a culpada.
Apele para a justiça do meu coração,
Talvez não sejas condenada.
No tribunal do meu coração
Vou pedir tua absolvição.
Nossa vida foi uma quimera
Se voltares hás de ser muito sincera.

Canta, meu bem, canta,
Quero ouvir teu cantar!
Chora, meu bem, chora,
Quero ver a tua lágrima derramar!
Sofre porque foste a culpada.
Apele para a justiça do meu coração,
Talvez não sejas condenada.

(Wilson Baptista)

30 de mai. de 2008

Meu amor já foi embora

Meu amor já foi embora
Na tristeza eu fiquei.
E não podendo conter a dor do meu padecer
Foi por isso que eu chorei.
Uma falsidade é triste
Sem a gente merecer.
Tudo eu posso relevar, mas essa ingratidão
Não poderei esquecer.
E na hora da partida fiz uma investida,
Quase implorei para ela ficar,
Mas pra não dar ousadia
Que era covardia
Aos pés de uma mulher chorar.
Meu amor já foi embora ...
(Cartola / Zé Com Fome)



23 de mai. de 2008

Da Maior Importância

Foi um pequeno momento, um jeito
Uma coisa assim
Era um movimento que aí você não pôde mais
Gostar de mim direito
Teria sido na praia, medo
Vai ser um erro, uma palavra
A palavra errada
Nada, nada
Basta quase nada
E eu já quase não gosto
E já nem gosto do modo que de repente
Você foi olhada por nós

Porque eu sou tímido e teve um negócio
De você perguntar o meu signo quando não havia
Signo nenhum
Escorpião, sagitário, não sei que lá
Ficou um papo de otário, um papo
Ia sendo bom
É tão difícil, tão simples
Difícil, tão fácil
De repente ser uma coisa tão grande
Da maior importância
Deve haver uma transa qualquer
Pra você e pra mim
Entre nós

E você jogando fora, agora
Vá embora, vá!
Há de haver um jeito qualquer, uma hora!
Há sempre um homem
Para uma mulher
Há dez mulheres para cada um
Uma mulher é sempre uma mulher etc. e tal
E assim como existe disco voador
E o escuro do futuro
Pode haver o que está dependendo
De um pequeno momento puro de amor

Mas você não teve pique e agora
Não sou eu quem vai
Lhe dizer que fique
Você não teve pique
E agora não sou eu quem vai
Lhe dizer que fique
Mas você
Não teve pique
E agora
Não sou eu quem vai
Lhe dizer que fique


(Caetano Veloso)

20 de mai. de 2008

Meu esquema

Ela é meu treino de futebol
Ela é meu domingão de sol
Ela é meu esquema

Ela é meu concerto de rock'roll
Nação, minha torcida gritando gol
Minha Ipanema

Ela é meu curso de anatomia
Ela é meu retiro espiritual
Ela é minha história

Ela é meu desfile internacional
Ela é meu bloco de carnaval
Minha evolução...

Galega
Tento descrever o que é estar com você

Princesa
Todos vão saber que eu estou muito bem com você

Ela é minha ilha da Fantasia
A mais avançada das terapias
Meu Playcenter

Ela é minha pista alucinada
A mais concorrida das baladas
Meu inferninho

Ela é meu esporte radical
Poderosa, viciante, mas não faz mal
Meu docinho

Ela é o que meu médico receitou
Rivaldo Maravilha mandando um gol
Minha chapação...

Galega
Nem dá pra dizer o que é estar com você

Princesa
Todo mundo vê que eu sou mais...

(Fred 04)

O quereres

Onde queres revólver, sou coqueiro;
Onde queres dinheiro, sou paixão!

Onde queres descanso, sou desejo;
E onde sou só desejo, queres não!

E onde não queres nada, nada falta;
E onde voas bem alto, eu sou o chão;

E onde pisas no chão,
Minha alma salta: e ganha liberdade na amplidão...

Onde queres família, sou maluco;
E onde queres romântico, burguês!

Onde queres leblon, sou pernambuco;
E onde queres eunuco, garanhão!

E onde queres o sim e o não, talvez;
Onde vês, eu não vislumbro razão!

Onde queres o lobo, eu sou o irmão;
E onde queres cowboy, eu sou chinês!

Ah, bruta flor do querer...
Ah, bruta flor, bruta flor!

Onde queres o ato, eu sou o espírito;
E onde queres ternura, eu sou tesão!

Onde queres o livre, decassílabo;
E onde buscas o anjo, eu sou mulher!

Onde queres prazer, sou o que dói;
E onde queres tortura, mansidão!

Onde queres o lar, revolução;
E onde queres bandido, eu sou o herói!

Eu queria querer-te amar o amor,
Construírmos dulcíssima prisão;

E encontrar a mais justa adequação:
Tudo métrica e rima e nunca dor!

Mas a vida é real e é de viés,
E vê só que cilada o amor me armou:

Eu te quero e não me queres como sou;
Não te quero e não me queres como és...

Ah, bruta flor do querer...
Ah, bruta flor, bruta flor!

Onde queres comício, flipper vídeo;
E onde queres romance, rock'n roll!

Onde queres a lua, eu sou o sol;
Onde a pura-natura, o inseticídeo!

E onde queres mistério, eu sou a luz;
Onde queres um canto, o mundo inteiro!

Onde queres quaresma, fevereiro;
E onde queres coqueiro, eu sou obus!

O quereres e o estares sempre a fim,
Do que em mim é em ti tão desigual...

Faz-me querer-te bem;
Querer-te mal:

Bem a ti, mal ao quereres assim:

Infinitivamente impessoal;
E eu querendo querer-te sem ter fim!

E querendo-te,
Aprender o total...

Do querer que há;
E do que não há em mim!

(Caetano Veloso)

19 de mai. de 2008

Jura secreta

Só uma coisa me entristece
O beijo de amor que não roubei
A jura secreta que não fiz
A briga de amor que não causei
Nada do que posso me alucina
Tanto quanto o que não fiz
Nada do que eu quero me suprime
De que por não saber inda dão quis
Só uma palavra me devora
Aquela que meu coração não diz
Só o que me cega, o que me faz infeliz
É o brilho do olhar que não sofri

(Sueli Costa e Abel Silva)

Ele me deu um beijo na boca

Ele me deu um beijo na boca e me disse
A vida é oca como a toca
De um bebê sem cabeça
E eu ri a beça
E ele: como uma toca de raposa bêbada
E eu disse: chega da sua conversa
De poça sem fundo
Eu sei que o mundo
É um fluxo sem leito
E e só no oco do seu peito
Que corre um rio
Mas ele concordou que a vida é boa
Embora seja apenas a coroa:
A cara é o vazio
E ele riu e riu e ria
E eu disse: Basta de filosofia
A mim me bastava que o prefeito desse um jeito
Na cidade da Bahia
Esse feito afetaria toda a gente da terra
E nós veríamos nascer uma paz quente
Os filhos da guerra fria
Seria um anticidente
Como uma rima
Desativando a trama daquela profecia
Que o Vicente me contou
Segundo a astronomia
Que em Novembro do ano que inicia
Sete astros se alinharão em escorpião
Como só no dia da bomba de Hiroshima
E ele me olhou
De cima e disse assim pra mim
Delfim, Margareth Tatcher, Menahem Begin
Política é o fim
E a crítica que não toque na poesia
O Time Magazine quer dizer que os Rolling Stones
Já não cabem no mundo do Time Magazine
Mas eu digo (Ele disse)
Que o que já não cabe é o Time Magazine
No mundo dos Rollings Stones Forever Rockin´And Rolling
Por que forjar desprezo pelo vivos
E fomentar desejos reativos
Apaches, Punks, Existencialistas, Hippies, Beatniks
De todos os Tempos Univos
E eu disse sim, mas sim, mas não nem isso
Apenas alguns santos, se tantos, nos seus cantos
E sozinhos
Mas ele me falou: Você tá triste
Porque a tua dama te abandona
E você não resiste, Quando ela surge
Ela vem e instaura o seu cosmético caótico
Você começa olhar com olho gótico
De cristão legítimo
Mas eu sou preto, meu nego
Eu sei que isso não nega e até ativa
O velho ritmo mulato
E o leão ruge
O fato é que há um istmo
Entre meus Deus
E seus Deuses
Eu sou do clã do Djavan
Você é fã do Donato
E não nos interessa a tripe cristã
De Dilan Zimerman
E ele ainda diria mais
Mas a canção tem que acabar
E eu respondi:
O Deus que você sente é o deus dos santos:
A superfície iridescente da bola oca,
Meus deuses são cabeças de bebês sem touca
Era um momento sem medo e sem desejo
Ele me deu um beijo na boca
E eu correspondi àquele beijo.


(Caetano Veloso)

9 de mai. de 2008

I wants to stay here

Bess
I wants to stay here,
But I aint worthy.
You is too decent to understan.
For when I see him he hypnotize me.
When he take hold of me with his hot hand.
Someday I know hes coming back to call me.
Hes goin to handle me an hold me so.
Its goin to be like dyin, Porgy, deep inside me -
But when he calls, I know I have to go.

Porgy
If dere warnt no Crown, Bess, if dere was only jus you an
Porgy, what den?

Bess
I loves you, Porgy,
Don let him take me,
Don let him handle me an drive me mad.
If you kin keep me,
I wants to stay here wid you forever,
An Id be glad.

Porgy
There, there, Bess, you don need to be afraid no mo,
Yous picked up happiness and laid yo worries down.
You goin to live easy, you goin to live high.
You goin to outshine every woman in dis town.
An remember, when Crown come thats my business, Bess!

Bess
I loves you, Porgy,
Don let him take me
Don let him handle me
With his hot han
If you kin keep me
I wants to stay here wid you forever.
I got my man.

Porgy
What you think I is, anyway,
To let dat dirty houn dog steal my woman?
If you wants to stay wid Porgy, you goin stay.
You got a home now, honey, an you got love.
So no mo cryin, cant you understan?
You goin to go about yo business, singin cause
You got Porgy, you got a man.

(Ira Gershwin, DuBose Heyward, George Gershwin )

I loves you Porgy

I loves you, Porgy,
Don't let him take me
Don't let him handle me
And drive me mad
If you can keep me
I wanna stay here with you forever
And I'll be glad

Yes I loves you, Porgy,
Don't let him take me
Don't let him handle me
With his hot hands
If you can keep me
I wants to stay here with you forever
I've got my man

I loves you, Porgy,
Don't let him take me
Don't let him handle me
And drive me mad
If you can keep me
I wanna stay here with you forever
I've got my man

Someday I know he's coming to call me
He's going to handle me and hold me
So, it' going to be like dying, Porgy
When he calls me
But when he comes I know I'll have to go

I loves you, Porgy,
Don't let him take me
Honey, don't let him handle me
and drive me mad
If you can keep me
I wanna stay here with you forever
I've got my man

(Ira Gershwin, DuBose Heyward, George Gershwin )

8 de mai. de 2008

Basta um dia

Pra mim
Basta um dia
Não mais que um dia
Um meio dia
Me dá
Só um dia
E eu faço desatar
A minha fantasia
Só um
Belo dia
Pois se jura, se esconjura
Se ama e se tortura
Se tritura, se atura e se cura
A dor
Na orgia
Da luz do dia
É só
O que eu pedia
Um dia pra aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia

Só um
Santo dia
Pois se beija, se maltrata
Se come e se mata
Se arremata, se acata e se trata
A dor
Na orgia
Da luz do dia
É só
O que eu pedia, viu
Um dia pra aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia

(Chico Buarque)

28 de abr. de 2008

Eu sonhei que tu estavas tão linda

Eu sonhei que tu estavas tão linda
Numa festa de raro esplendor,
Teu vestido de baile lembro ainda,
Era branco, todo branco, meu amor.

A orquestra tocou uma valsa dolente,
Tomei-te aos braços, fomos bailando
Ambos silentes,
E os pares que volteavam entre nós
Diziam versos, trocavam juras
A meia voz.

Violinos enchiam o ar de emoções
E de desejos uma centena de corações.
Pra despertar teu ciúme
Tentei flertar alguém,
Mas tu não flertaste ninguém.

Olhavas só para mim,
Vitórias de amor cantei,
Mas foi tudo um sonho, acordei.

(Lamartine Babbo e Francisco Mattoso)

25 de abr. de 2008

Viver do amor

Pra se viver do amor
Há que esquecer o amor
Há que se amar
Sem amar
Sem prazer
E com despertador
- como um funcionário

Há que penar no amor
Pra se ganhar no amor
Há que apanhar
E sangrar
E suar
Como um trabalhador

Ai, o amor
Jamais foi um sonho
O amor, eu bem sei
Já provei
E é um veneno medonho

É por isso que se há de entender
Que o amor não é um ócio
E compreender
Que o amor não é um vício
O amor é sacrifício
O amor é sacerdócio
Amar
É iluminar a dor
- como um missionário

(Chico Buarque)

24 de abr. de 2008

PRELÚDIOS-INTENSOS PARA OS DESMEMORIADOS DO AMOR.

HILDA HILST


I

Toma-me. A tua boca de linho sobre a minha boca
Austera. Toma-me AGORA, ANTES
Antes que a carnadura se desfaça em sangue, antes
Da morte, amor, da minha morte, toma-me
Crava a tua mão, respira meu sopro, deglute
Em cadência minha escura agonia.

Tempo do corpo este tempo, da fome
Do de dentro. Corpo se conhecendo, lento,
Um sol de diamante alimentando o ventre,
O leite da tua carne, a minha
Fugidia.
E sobre nós este tempo futuro urdindo
Urdindo a grande teia. Sobre nós a vida
A vida se derramando. Cíclica. Escorrendo.

Te descobres vivo sob um jogo novo.
Te ordenas. E eu deliquescida: amor, amor,
Antes do muro, antes da terra, devo
Devo gritar a minha palavra, uma encantada
Ilharga
Na cálida textura de um rochedo. Devo gritar
Digo para mim mesma. Mas ao teu lado me estendo
Imensa. De púrpura. De prata. De delicadeza.


II

Tateio. A fronte. O braço. O ombro.
O fundo sortilégio da omoplata.
Matéria-menina a tua fronte e eu
Madurez, ausência nos teus claros
Guardados.

Ai, ai de mim. Enquanto caminhas
Em lúcida altivez, eu já sou o passado.
Esta fronte que é minha, prodigiosa
De núpcias e caminho
É tão diversa da tua fronte descuidada.

Tateio. E a um só tempo vivo
E vou morrendo. Entre terra e água
Meu existir anfíbio. Passeia
Sobre mim, amor, e colhe o que me resta:
Noturno girassol. Rama secreta.


III

Contente. Contente do instante
Da ressurreição, das insônias heróicas
Contente da assombrada canção
Que no meu peito agora se entrelaça.
Sabes? O fogo iluminou a casa.
E sobre a claridade do capim
Um expandir-se de asa, um trinado

Uma garganta aguda, vitoriosa.

Desde sempre em mim. Desde
Sempre estiveste. Nas arcadas do Tempo
Nas ermas biografias, neste adro solar
No meu mudo momento

Desde sempre, amor, redescoberto em mim.


IV

Que boca há de roer o tempo? Que rosto
Há de chegar depois do meu? Quantas vezes
O tule do meu sopro há de pousar
Sobre a brancura fremente do teu dorso?

Atravessaremos juntos as grandes espirais
A artéria estendida do silêncio, o vão
O patamar do tempo?

Quantas vezezs dirás: vida, vésper, magna-marinha
E quantas vezes direi: és meu. E as distendidas
Tardes, as largas luas, as madrugadas agônicas
Sem poder tocar-te. Quantas vezes, amor

Uma nova vertente há de nascer em ti
E quantas vezes em mim há de morrer.
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