24 de abr. de 2008

NÃO

NÃO
não
nÃo
nãO
NÃo


(a.l.k.)

O coração bate errado

Concêntricos, os sentidos das coisas atingem com atrozes garras aquilo que pode ser o coração. Eles, ao contrário de tudo, vêm de fora, amplos fortes longos e comprimem com descomunal força aquilo que tenta viver. Eles agem e eles não se pensam, pois são coisas. Eles são. Eles ali. Por sobre. Atrozes. Ferozes. Vis. E inocentes. Se o eu do corpo do coração permite que isso seja assim arde-se-me a alma e com toda a complacência do Universo deve-se-me ser aceito. Eles não têm culpa. Não há culpa. O corpo vai e permite. Acompanha. Cala. Aceita. Eles dizem não e seguem. Sem a fraqueza que o pensamento em demasia confere ao fraco pulsante centro da vida. Por vezes muitas, ou todas sempre, o corpo quis que as respostas fossem iguais às suas: falsamente generosas e tomadas de total descaso consigo e com o desejo mais íntimo em ser-se só assim bem. Eles fazem o que é melhor, no instinto, no desejo na vontade. Isto é o certo. O coração bate errado.

(a.l.k.)

Uma Canção Desnaturada

Por que cresceste, curuminha
Assim depressa, e estabanada
Saíste maquilada
Dentro do meu vestido
Se fosse permitido
Eu revertia o tempo
Pra reviver a tempo
De poder

Te ver as pernas bambas, curuminha
Batendo com a moleira
Te emporcalhando inteira
E eu te negar meu colo
Recuperar as noites, curuminha
Que atravessei em claro
Ignorar teu choro
E cuidar só de mim

Deixar-te arder em febre, curuminha
Cinqüenta graus, tossir, bater o queixo
Vestir-te com desleixo
Tratar uma ama-seca
Quebrar tua boneca, curuminha
Raspar os teus cabelos
E ir te exibindo pelos
Botequins

Tornar azeite o leite
Do peito que mirraste
No chão que engatinhaste, salpicar
Mil cacos de vidro
Pelo cordão perdido
Te recolher pra sempre
À escuridão do ventre, curuminha
De onde não deverias

(Chico Buarque)

18 de abr. de 2008

Estranho rapaz

Quando ele chegou, o estranho rapaz,
Seu olhar estrangeiro olhou para mim.
Eu nunca tinha ouvido a fala do amor.
O frio, o calor, eu logo entendi
Quando o rapaz, seu olhar estrangeiro,
Olhou para mim.
Seu olhar estrangeiro falava uma língua
Que eu logo entendi.
Senti no meu corpo uma coisa tão louca
Que eu nunca senti.
Ele olhava a minha boca, ele olhava o meu corpo
Ele olhava em meu seio,
Olhava no meio, bem dentro de mim.
No princípio, o perigo, depois eu olhava, olhava
Não tinha receio.
Desejava, queria no precipício
Abrir minhas asas, desvendar o segredo.
Seu olhar penetrante invadia ofegante
No meio de mim.
Rasgava o meu ventre, meu corpo inteiro
Me vendo por fora, me vendo por dentro
Do princípio ao fim.
Depois me olhou, me olhou, me olhou
De baixo pra cima, em cima e embaixo
Bem dentro de mim
Me queimando, queimando,
O céu no inferno, o paraíso é assim.
Onde passou tão pouco deixou,
Só um rastro de fogo queimando em silêncio
No incêndio do amor.

(Roberto Mendes – Capinam)

17 de abr. de 2008

San Vicente

Coração americano
Acordei de um sonho estranho
Um gosto, vidro e corte
Um sabor de chocolate
No corpo e na cidade
Um sabor de vida e morte
Coração americano
Um sabor de vida e morte

A espera na fila imensa
E o corpo negro se esqueceu
Estava em San Vicente
A cidade e suas luzes
Estava em San Vicente
As mulheres e os homens
Coração americano
Com sabor de vidro e corte

Ôoooooooooooo...
As horas não se contavam
E o que era negro anoiteceu
Enquanto se esperava
Eu estava em San Vicente
Enquanto acontecia
Eu estava em San Vicente
Coração americano
Um sabor de vidro e corte

(Milton Nascimento - Fernando Brant)

15 de abr. de 2008

Zambi

É Zambi no açoite, ei, ei, é Zambi
É Zambi tui, tui, tui, tui, é Zambi
É Zambi na noite, ei, ei, é Zambi
É Zambi tui, tui, tui, tui, é Zambi

Chega de sofrer, ei!
Zambi gritou
Sangue a correr
É a mesma cor
É o mesmo adeus
É a mesma dor

É Zambi se armando, ei, ei, é Zambi
É Zambi tui, tui, tui, tui, é Zambi
É Zambi lutando, ei, ei, é Zambi
É Zambi tui, tui, tui, tui, é Zambi

Chega de viver, ê
Na escravidão
É o mesmo céu
O mesmo chão
O mesmo amor
Mesma paixão

Ganga-zumba, ei, ei, ei, vai fugir
Vai lutar, tui, tui, tui, tui, com Zambi
E Zambi, gritou ei, ei, meu irmão
Mesmo céu, tui, tui, tui, tui
Mesmo chão

Vem filho meu
Meu capitão
Ganga-zumba
Liberdade
Liberdade
Liberdade
Vem meu filho

É Zambi morrendo, ei, ei, é Zambi
É Zambi, tui, tui, tui, tui, é Zambi
Ganga Zumba, ei, ei, ei, vem aí
Ganga Zumba, tui, tui, tui, é Zambi

(Vinicius de Moraes / Edu Lobo)

13 de abr. de 2008

Tempo Rei

Não me iludo
Tudo permanecerá
Do jeito que tem sido
Transcorrendo
Transformando
Tempo e espaço navegando
Todos os sentidos...

Pães de Açúcar
Corcovados
Fustigados pela chuva
E pelo eterno vento...

Água mole
Pedra dura
Tanto bate
Que não restará
Nem pensamento...

Tempo Rei!
Oh Tempo Rei!
Oh Tempo Rei!
Transformai
As velhas formas do viver
Ensinai-me
Oh Pai!
O que eu, ainda não sei
Mãe Senhora do Perpétuo
Socorrei!...

Pensamento!
Mesmo o fundamento
Singular do ser humano
De um momento, para o outro
Poderá não mais fundar
Nem gregos, nem baianos...

Mães zelosas
Pais corujas
Vejam como as águas
De repente ficam sujas...

Não se iludam
Não me iludo
Tudo agora mesmo
Pode estar por um segundo...

(Gilberto Gil)

7 de abr. de 2008

das intermitências e das expectativas

como sempre ou desde sempre, há muito, desde que o gosto existe na boca e o sal da lágrima é soro de nova ânima é assim. desse jeito espesso e turvo e vazio de quem se está no oco. de estar do lado de fora. de não ser hábil. e débil curvar-se ao sim. entretanto o triângulo seria tão fácil, mas nunca se sabe na mente ou na lágrima se era o necessitado ou o preciso. outrem mundos pronunciou-o nos gestos, e mesmo na liquidez mera da palavra. no entanto aquele um, o inábil, torto, não se apropriou nunca em nenhuma das vezes dos três pontos que negam. aquele um apenas soube sabia unir os pontos assertivos e macios da benevolente condescendência. triste. amargo. sombrio. musgo. tomado de uma estranha capacidade de negar o impossível e aceitar com as lâminas profundas o desvelo e o abandono espelhado. que nem era. mas nem se fosse não seria tão dor. e as lágrimas nem mais vinham.

(a.l.k.)

6 de abr. de 2008

Dura na queda (Ela desatinou nº 2)

Perdida
Na avenida
Canta seu enredo
Fora do carnaval
Perdeu a saia
Perdeu o emprego
Desfila natural

Esquinas
Mil buzinas
Imagina orquestras
Samba no chafariz
Viva a folia
A dor não presta
Felicidade, sim

O sol ensolarará a estrada dela
A lua alumiará o mar
A vida é bela
O sol, a estrada amarela
E as ondas, as ondas, as ondas, as ondas

O sol ensolarará a estrada dela
A lua alumiará o mar
A vida é bela
O sol, a estrada amarela
E as ondas, as ondas, as ondas, as ondas

Bambeia
Cambaleia
É dura na queda
Custa a cair em si
Largou família
Bebeu veneno
E vai morrer de rir

Vagueia
Devaneia
Já apanhou à beça
Mas para quem sabe olhar
A flor também é
Ferida aberta
E não se vê chorar

O sol ensolarará a estrada dela
A lua alumiará o mar
A vida é bela
O sol,a estrada amarela
E as ondas, as ondas, as ondas, as ondas

O sol ensolarará a estrada dela
A lua alumiará o mar
A vida é bela
O sol,a estrada amarela
E as ondas, as ondas, as ondas, as ondas

(Chico Buarque)

Ela desatinou

Ela desatinou
Viu chegar quarta-feira
Acabar brincadeira
Bandeiras se desmanchando
E ela ainda está sambando

Ela desatinou
Viu morrer alegrias
Rasgar fantasias
Os dias sem sol raiando
E ela ainda está sambando

Ela não vê que toda gente
Já está sofrendo normalmente
Toda cidade anda esquecida
Da falsa vida da avenida onde

Ela desatinou
Viu morrer alegrias
Rasgar fantasias
Os dias sem sol raiando
E ela inda está sambando

Quem não inveja a infeliz
Feliz no seu mundo de cetim
Assim debochando
Da dor, do pecado
Do tempo perdido
Do jogo acabado

(Chico Buarque)

Inversão

Na ordem certa das coisas, aquilo deveria ser uma notícia.
Com as coisas todas turbulentas, aquilo é o que se pode.
E eu não posso nem passo além do círculo que me detém no pensamento.
As ações não condizem pois não estão na ordem certa das coisas.
Mas as coisas estão lá,
quadradas, esféricas, alongadas, planas duras, imóveis, coloridas,
quentes, voluptuosas,
sendo cada vez menos o que elas são.
Mas eu não posso ir.
Lanço sinais por sobre o círculo, um tubo, um mundo, uma redoma.
As coisas não agem pois não são.
Não as atinjo, elas não vêm.
Tremores.
E eu não posso nem passo além do círculo que me detém no pensamento.
Elas então me sorriem
E eu apedreço.

(a.l.k.)

Bruma

Noite longa
Dia insone
Gostos confusos
Pessoas mortas
Carnes vivas

E a bruma.

Rostos difusos
Umbrais sem portas
Labirintos

E a bruma.

E em cada olhar um desvão
imenso e furioso
Um vazio ávido
sedento
Pessoas mortas
Sem sorrisos.

Só a bruma.

(a.l.k.)

Cratera

O mundo assim envolta é algo incontestável. Mas o de dentro é vários, é múltiplo, é intenso, é deserto puro, é. No fundo não se vê no escuro. O mundo de dentro está no escuro sombrio vermelho, bem no fundo, na cratera da alma. Naturezas e sabores do de fora não invadem esse mundo, no entanto vermelho enegrecido da cratera efervescente se derrama por sobre, por entre, embaixo, envolve o mundo que os olhos dizem que existe.

(a.l.k.)

I Get A Kick Out of You

My story is much to sad to be told
But practically everything leaves me totally cold
The only exception I know is the case
When I'm out on a quiet spree, fighting vainly the old ennui
And I suddenly turn and see
Your fabulous face

I get no kick from champagne
Mere alcohol doesn't thrill me at all
So tell me why should it be true
That I get a kick out of you


Some get a kick from cocaine
I'm sure that if I took even one sniff
That would bore me terrifically too
But I get a kick out of you
I get a kick every time I see you standing there before me
I get a kick though it's clear to me, you obviously don't adore me
I get no kick in a plane
Flying too high with some guy in the sky
Is my idea of nothing to do
Yet I get a kick out of you

(Cole Porter)

5 de abr. de 2008

Too Darn Hot

It's too darn hot!
It's too darn hot!
I'd like to sup with my baby tonight,
Refill the cup with my baby tonight.
I'd like to sup with my baby tonight,
Refill the cup with my baby tonight,
But I ain't up to my baby tonight
'Cause it's too darn hot

It's too darn hot!
It's too darn hot!
I'd like to coo with my baby tonight,
And pitch the woo with my baby tonight.
I'd like to coo with my baby tonight,
And pitch the woo with my baby tonight.
But brother you fight my baby tonight
'Cause it's too darn hot

According to the Kinsey Report
Ev'ry average man you know
Much prefers his love-y dove-y to court
When the temperature is low,
But when the thermometer goes 'way up
And the weather is sizzling hot,
Mister pants for romance is not

'Cause it's too, too,
Too darn hot!
It's too darn hot!
It's too, too darn hot!
I'd like to coo with my baby tonight
And pitch the woo with my baby tonight
I'd like to coo with my baby tonight,
Pitch the woo with my baby tonight
But brother, you fight my baby tonight
'Cause it's too darn hot!

According to the Kinsey Report
Ev'ry average man you know
Much prefers his lovey dovey to court
When the temperature is low
But when the thermometer goes 'way up
And the weather is sizzling hot,
Mr. Gob for his squab,
A marine for his queen,
A G.I. for his cutie-pie is not

'Cause it's too, too,
Too darn hot!
It's too darn hot!
It's too darn hot
It's too darn hot
It's too darn hot
It's too darn hot!

(Cole Porter / 1948)
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