Pura? Que vem a ser isso?
As línguas do inferno
São baças, baças como as tríplices
Línguas do apático, gordo Cérbero
Que arqueja junto à entrada. Incapaz
De lamber limpamente
O febril tendão, o pecado, o pecado.
Crepita a chama.
O indelével aroma
De espevitada vela!
Amor, amor, escassa a fumaça
Rola de mim como a echarpe de Isadora, e temo
Que uma das bandas venha a prender-se na roda.
A amarela e morosa fumaça
Faz o seu próprio elemento. Não irá alto
Mas rolará em redor do globo
A asfixiar o idoso e o humilde,
O frágil
E delicado bebê no seu berço,
A lívida orquídea
Suspensa do seu jardim suspenso no ar,
Diabólico leopardo!
A radiação faz que ela embranqueça
E a extingue em uma hora.
Engordurar os corpos dos adúlteros
Tal qual as cinzas de Hiroshima e corroê-los.
O pecado. O pecado.
Querido, a noite inteira
Eu passei oscilando, morta, viva, morta, viva.
Os lençois opressivos como beijos de um devasso.
Três dias. Três noites.
água de limão, canja
Aguada, enjoa-me.
Sou por demais pura para ti ou para alguém.
Teu corpo
Magoa-me como o mundo magoa Deus. Sou uma lanterna -
Minha cabeça uma lua
De papel japonês, minha pele de ouro laminado
Infinitamente delicada e infinitamente dispendiosa.
Não te assombra meu coração. E minha luz.
Eu sou, toda eu, uma enorme camélia
Esbraseada e a ir e vir, em rubros jorros.
Creio que vou subir,
Creio que posso ir bem alto -
As contas de metal ardente voam, e eu, amor, eu
Sou uma virgem pura
De acetileno
Acompanhada de rosas,
De beijos, de querubins,
Do que venham a ser essas coisas rosadas.
Não tu, nem ele
Não ele, nem ele
(Eu toda a dissolver-me, anágua de puta velha) -
Ao Paraíso.
Sylvia Plath
(Tradução: Afonso Félix de Souza)
17 de jul. de 2008
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